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August 18, 2024

Numa mesma semana foram-se, Gena Rowlands e Alain Delon

 

Dois actores da mesma geração mas de universos e calibres muito diferentes.


We must bear witness, spread the word, and show respect to those who endow us with their souls.
Tennessee Williams, em entrevista (1982), cita o nome de Gena Rowlands.


Rowlands não estava interessada em conclusões limpas, ficções arrumadas, nada que não fosse inteiramente honesto. Para ela, actuar era uma oportunidade de explorar as relações entre homens e mulheres e o quão difícil - e normalmente impossível - é viver entre outros que existem nas suas próprias neuroses e filosofias e nos seus próprios termos.
Ao longo da sua filmografia, Rowlands actuou com uma fluidez que parecia mais próxima do comportamento da vida real do que da representação cinematográfica. É por essa razão que as suas actuações foram muitas vezes confundidas com improvisação, apesar do método que ela lhes imprimia. Leitora em primeiro lugar, baseava muitas de suas atuações na sua própria análise do guião e apropriava-se de todos os papéis que representava. (vulture)

Duas grandes representações:


A Women Under the Influence (1974)


Opening Night
(with John Cassavetes)




Alain Delon foi um actor que, como acontece à maioria, entrou no cinema por ser bonito. Tinha uma 'cara de anjo' como se dizia na altura. Dado pelos pais biológicos a uma família adoptiva aquando do seu divórcio, desceu bastante na escala social, foi expulso de várias escolas, pequeno ladrão, preso ocasionalmente, soldado na marinha de guerra -de onde foi expulso- e finalmente gigolô em Montmartre, onde foi 'descoberto'. Valeu-lhe, talvez, ter tido essa infância e adolescência complicadas e cheias de peripécias que lhe deram muito material para compreender e criar as suas personagens. Costumava dizer que não representava papéis, vivia-os. 

Dois filmes: 

Le Samouraï, (1967) o filme que fez dele um ícone. Parece um livro de banda desenhada, animado. É o que gosto mais no filme.


La Piscine (1968) - confesso que não vejo este filme há perto de 40 anos. O filme é da década do 'amor livre' e vive da beleza de Alain Delon, Romy Schneider, Maurice Ronet e Jane Birkin, mais ou menos despidos o tempo todo e sempre em explosão sensual, numa piscina, em Nice, num mundo falsamente idílico, muito superficial. Na altura fez um enorme sucesso porque era um filme cheio de erotismo. Lembro-me de ter achado o filme machista (cheio do que hoje chamamos, the male gazecomo tantos dos clássicos franceses - e um bocadinho aborrecido também: os ciúmes, as tensões psicológicas do dinheiro e do sexo. Os franceses adoram o filme.
A ver este excerto é difícil não perceber a distância, em termos de representação artística, que separa Romy Schneider de Jane Birkin, uma modelo, casada com Serge Gainsbourg (um indivíduo asqueroso e repugnante), mãe de Charlotte Gainsbourg, esta sim, muito boa actriz.

January 10, 2022

Estou a fazer uma formação muito interessante

 


Da Associação Portuguesa de Ética e Filosofia Prática. Sobre como o cinema usa os conceitos de Lacan para construir a narrativa. Sei um bocado das Psicanálise de Freud mas sou, basicamente, uma ignorante de Lacan, de modo que estou a aprender conceitos novos e uma ferramenta para olhar os filmes com uma lente lacaniana. Muito interessante. Estou convencida que vou ficar com a sensação de saber a pouco. O formador é um rapaz novo formado na London Film School que está em Hollywood.

Espelhos de terror e suspense em Hollywood. A nossa ansiedade de espectadores pela ansiedade da personagem na imagem de si como si e de si como outro. Estou a gostar.

February 22, 2021

Martin Scorsese acerca da sobrevivência do cinema e da pobreza das plataformas de streaming

 


Num texto forte, Scorsese castiga as plataformas de streaming

Num longo ensaio sobre Federico Fellini, o cineasta recordou que a omnipotência das plataformas de streaming ameaça seriamente a nossa visão das obras de arte.

Martin Scorsese está seriamente preocupado com o futuro do cinema. Já em 2019, tinha comparado os filmes Marvel a "parques de diversão" e lamentou a omnipresença de blockbusters na paisagem cinematográfica, com desagrado de mestres como Joss Whedon ou James Gunn. 

Hoje, numa altura em que a indústria está a abrandar devido à pandemia, publica um ensaio sobre Fellini para a Harper's Magazine, intitulado Il Maestro e, mais uma vez, defende a sua visão da sétima arte.

Volta em particular à definição do termo "cinema", que hoje parece perigosamente reduzida à de "conteúdo": "Até há quinze anos, o que é muito recente, o termo "conteúdo" só era entendido quando as pessoas discutiam o cinema de uma forma séria, em comparação com a "forma". 
Depois, pouco a pouco, foi sendo utilizado cada vez mais por pessoas que assumiram o controlo de empresas de comunicação social, a maioria das quais nada sabia sobre a história da arte, ou mesmo não se importava", escreve ele, visando explicitamente os gigantes do streaming. 

Embora o cineasta recorde que também ele beneficiou do apoio da plataforma - Netflix produziu o seu último filme, The Irishman e a Apple irá produzir o próximo, Killers of the Flower Moon - ele denuncia esta nova era em que "o cinema é sistematicamente desvalorizado, marginalizado, depreciado e reduzido ao seu mínimo denominador comum: conteúdo". Este termo refere-se a "um filme de David Lean, um vídeo de gato, um comercial do Super Bowl, uma sequela de super-herói, um episódio em série", acrescenta ele.


A ilusão de escolha democrática

"A apresentação de todo o tipo de filmes como conteúdo criou esta situação em que tudo é apresentado ao mesmo nível ao espectador. Cria a ilusão de escolha democrática, mas não é esse o caso. Porque este conteúdo é sugerido por algoritmos baseados no que já se viu", continua ele.
"Então é sugerido de acordo com o tema do filme ou do seu género, mas o que é que isso tem a ver com a arte do cinema? A cura não é "antidemocrática" ou "elitista", um termo que é tão frequentemente utilizado hoje em dia que perde o seu significado. É um acto de generosidade! Partilha-se o que se ama, o que o inspira. A propósito, as melhores plataformas de streaming, como o Criterion Channel ou MUBI, ou canais tradicionais como o MTC, fazem uma verdadeira cura. Os algoritmos, por definição, baseiam-se em cálculos, que tratam o espectador como um consumidor e nada mais".


Os tesouros da nossa cultura 

Martin Scorsese lembra-nos finalmente que deseja defender "o cinema e a importância que este tem na nossa cultura" e apela àqueles que conhecem a história do cinema a partilhá-la em massa: "Temos também de fazer compreender àqueles que detêm os direitos sobre estes filmes que eles representam muito mais do que um produto que pode ser explorado e depois deitado fora. Eles são os maiores tesouros da nossa cultura e devem ser tratados dessa forma. Penso que deveríamos redefinir a nossa noção do que é o cinema. E o que não é. 
Federico Fellini é uma boa maneira de iniciar esta reflexão. Pode dizer muitas coisas sobre os seus filmes, mas há uma coisa que é indiscutível: são obras de cinema. O seu trabalho a longo prazo tem sido a definição desta forma de arte.
Chamando ao falecido Fellini um "virtuoso do cinema", Scorsese conclui: "Tudo mudou - o cinema e a sua importância na nossa cultura. 
Claro que não é surpreendente que artistas como Godard, Bergman, Kubrick e Fellini, que em tempos governaram a nossa grande forma de arte como deuses, acabaram por se retirar para as sombras ao longo do tempo. Mas neste momento não podemos tomar nada como garantido.

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O que ele diz do cinema é o que se passa ao nível da cultura em geral e da educação em particular: dar às pessoas o que elas querem. Só que, em primeiro lugar não sabemos o que elas querem. Pelo facto de verem novelas daí não se segue que é o que querem ver: é aquilo a que têm acesso, de modo que é o que vêem e no reino do digital o algoritmo é rei. Em segundo lugar, em áreas da arte e da educação, em particular, dar às pessoas só que eles querem, ou seja, o que elas já conhecem e já gostam, é impedi-las de aceder a formas mais complexas, mais ricas, mais inspiradoras, etc.. da cultura. Como li outro dia um professor universitário, falar de modo simples, com palavras que as pessoas conhecem em frases simples que não as obrigue a fazer esforço é uma opção ética porque o oposto é envergonhá-las e desmotivá-las para a aprendizagem. Nunca vi argumento mais empobrecedor que este, a não ser nas criancices do SE da educação que também pensa assim: para quê dar a conhecer os poetas se os alunos gostam mais de escrever as suas 'opiniões' em plataformas digitais.

Devia escolher-se com um cuidado extremo as pessoas responsáveis por estas áreas da cultura e da educação. No Norte da Europa onde estas pedagogias do coitadinho já estão há muito implementadas na educação, assiste-se a uma gradual diminuição da fasquia geral do QI.

Como diz Scorsese, um autor partilha o que o inspira, aquilo que pensa, a sua maneira particular de ver e pensar o mundo e as relações entre as pessoas e tem uma linguagem própria que nem sempre é fácil. Não tem que ser fácil, nem ir ao encontro do que as pessoas quererem, porque na maior parte das vezes nem elas sabem o que querem antes de terem conhecimentos suficientes para perceberem que não sabiam o que pensavam saber.

March 22, 2020

Clássicos do cinema - para quem lhe apeteça um filme



Cena extraída do filme "Presidente" lançado em 1 de março de 1961

Um filme de 1961 inspirado no romance escrito por Georges Simenon em 1958. Georges Simenon já tinha entendido tudo sobre o futuro da Europa? Aqui está uma cena cheia de verdades tirada da adaptação desta novela, tocada por Jean Gabin e Bernard Publicar.

Veja o filme na íntegra: http://bit.ly/2lOHr6E

via La vraie démocratie


November 06, 2019

É por isso que o bom cinema nos humaniza



"For me, for the filmmakers I came to love and respect, for my friends who started making movies around the same time that I did, cinema was about revelation — aesthetic, emotional and spiritual revelation. It was about characters — the complexity of people and their contradictory and sometimes paradoxical natures, the way they can hurt one another and love one another and suddenly come face to face with themselves."

Martin Scorsese