Mais um articulista que reduz o problema da educação às greves, logo aos professores e concluiu que se calhar isto da escola pública é uma narrativa dogmática e que o melhor é pôr tudo privado (não diz, mas é o que quer dizer) porque aí os professores andam todos a toque de caixa, caladinhos que o respeitinho ao patrão é muito bonito.
Entretanto, todos os problemas -reais- que enumera não têm causa nem solução. Só que eu e mais uma data de gente há muito tempo que predizemos exactamente o que se esta agora a passar. Andamos há quinze anos a explicar que as políticas de educação são erradas e porquê e que iriam acabar com a decadência do ensino e da aprendizagem e com a escola a não ter professores.
Agora que lá chegámos, as soluções dos que nunca quiseram ouvir e pensar no assunto são, acabar com a escola pública. É à portuguesa: não queres encarar os problemas e quando eles te batem na cara como uma onda da Nazaré gritas que é preciso uma revolução. Porém, havia muitas reformas possíveis que nunca foram feitas.
Agora, que (quanto a mim) essa luta já está perdida, ando há uns quatro anos noutra de males que ainda se vai a tempo de evitar: a de se perder uma geração inteira ou mais, por causa do uso dos telemóveis e das redes sociais na infância e na adolescência. Esta é, actualmente, a maior causa de problemas de aprendizagem (e de outros problemas sociais e mentais) que incluem, foco, atenção, motivação, estimulação, linguagem, resistência à frustração, capacidade de empenho, perseverança e outros.
No entanto, os 'especialistas' da educação e os que vão atrás deles dizem que é preciso as crianças usarem as tecnologias ao seu alcance, como se uma tecnologia, só por ser tecnologia, fosse uma virtude. Daqui a 10 anos os 'especialistas' vão dizer que se perdeu uma geração porque os professores não souberam ensinar as crianças e adolescentes a usar os telemóveis responsavelmente, como se pudéssemos empurrar uma criança ou adolescente para um antro de pedófilos, criminosos, manipuladores gananciosos, proxenetas ou só idiotas profissionais e dizer-lhe, "entra e vai lá para dentro fazer amigos e aprender a ser como eles, mas enquanto por lá andares vê se te portas responsavelmente". Sendo as mesmas pessoas que vão pôr os filhos à escola, de carro, mesmo quando já andam no secundário, por receio dos perigos da sociedade actual. É uma anedota. Só que não dá vontade de rir.
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A análise que o DN faz neste dia sobre o estado das escolas públicas no final do primeiro período de aulas é muito mais do que uma listagem de horrores. Vejamos: um número não revelado, mas na casa das dezenas de milhares, de alunos sem pelo menos um professor três meses depois de o ano letivo começar; dezenas de milhares de computadores avariados e empilhados nas salas; números recorde de docentes a sair da profissão sem serem repostos; centenas de escolas com obras prometidas, mas nunca feitas. Das 446 greves de funcionários públicos registadas este ano, 279 são no setor da educação. O que significa que as possibilidades de os alunos da escola pública chegarem e esta estar fechada são exponencialmente maiores do que no privado.
Neste cenário, que qualidade de Ensino pode dar a escola pública, mesmo nos grandes centros urbanos? Portugal já se transformou num país em que só os filhos de pais com mais rendimento têm a garantia de poder ter um ano completo de aulas. É um facto. E o elevador social na escola pública está, desgraçadamente, mais dias parado do que a funcionar. Noutros não se lhe pode chegar, porque o portão está fechado a cadeado
Por mim, acho que há demasiados portugueses - não sei se influenciados pelas narrativas dos partidos em que votam - que se enquistaram em torno dos dogmas das qualidades intrínsecas, inabaláveis e inquestionáveis do SNS e da Escola Pública em Portugal. São, como é evidente para todos, falíveis. E precisam não de continuidade, mas de reformas profundas face ao modelo com que foram fundadas, o que existiu e que ainda existe. Mesmo que isso seja doloroso para o Governo do momento.
Nuno Vinha in Diário de Notícias
A análise que o DN faz neste dia sobre o estado das escolas públicas no final do primeiro período de aulas é muito mais do que uma listagem de horrores. Vejamos: um número não revelado, mas na casa das dezenas de milhares, de alunos sem pelo menos um professor três meses depois de o ano letivo começar; dezenas de milhares de computadores avariados e empilhados nas salas; números recorde de docentes a sair da profissão sem serem repostos; centenas de escolas com obras prometidas, mas nunca feitas. Das 446 greves de funcionários públicos registadas este ano, 279 são no setor da educação. O que significa que as possibilidades de os alunos da escola pública chegarem e esta estar fechada são exponencialmente maiores do que no privado.
Neste cenário, que qualidade de Ensino pode dar a escola pública, mesmo nos grandes centros urbanos? Portugal já se transformou num país em que só os filhos de pais com mais rendimento têm a garantia de poder ter um ano completo de aulas. É um facto. E o elevador social na escola pública está, desgraçadamente, mais dias parado do que a funcionar. Noutros não se lhe pode chegar, porque o portão está fechado a cadeado
Por mim, acho que há demasiados portugueses - não sei se influenciados pelas narrativas dos partidos em que votam - que se enquistaram em torno dos dogmas das qualidades intrínsecas, inabaláveis e inquestionáveis do SNS e da Escola Pública em Portugal. São, como é evidente para todos, falíveis. E precisam não de continuidade, mas de reformas profundas face ao modelo com que foram fundadas, o que existiu e que ainda existe. Mesmo que isso seja doloroso para o Governo do momento.
Nuno Vinha in Diário de Notícias
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