Nem mesmo com tanta notícia sobre o que se passa na escola pública JMT consegue perceber o cerne do problema: ninguém quer ser professor porque o trabalho é esgotante, muito difícil e mal pago. Há professores a reformarem-se mais cedo e com prejuízo para se irem embora de um trabalho que sucessivos governos e opinadores ignorantes destruíram com o seu veneno.
JMT pensa que se disser publicamente muito mal dos professores, como que por milagre, os professores aceitem suicidar-se pelo trabalho. Pois, vá esperando e entretanto, reze à virgem dos milagres...
Queixa-se que todos os dias há professores que faltam às aulas e do prejuízo que isso causa aos alunos. Porém, não se queixa, nem nunca se queixou da destruição da profissão, das práticas de mandar embora milhares de professores para reduzir ao mínimo os custos com a educação, da perda de direitos dos trabalhadores da profissão, da perda brutal de salário com os cortes arbitrários de sucessivos governos, da destruição da carreira, da transformação do horário não lectivo em lectivo, da contagem do trabalho dos professores ao minuto para obrigar a trabalhar mais horas, das infernais obrigações burocráticas e administrativas, das turmas cheias, dos alunos com necessidades especiais ficarem à total responsabilidade dos professores em turmas cheias, das turmas com 2, 3, 6 ou 7 nacionalidades, etc., etc. e mais etc.
Outro dia, ouvi Ricardo Silva, da APEDE, dizer que tem 60 anos e o seu horário tem 7 turmas, uma DT e uma sub-coordenação. JMT não faz ideia da extrema violência que é um horário de trabalho assim aos 60 anos. Como tem filhos a estudar na escola pública e vai à escola, JMT pensa que sabe do trabalho e dos problemas do trabalho dos professores, um pouco como as pessoas que vão muito a médicos e hospitais e, por isso, pensam que sabem muito sobre doenças e sobre as exigências do trabalho dos médicos mas, pelo que escreve no jornal, percebemos que não sabe e continua na senda de só dizer mal de professores e em nada contribuir para a solução dos problemas.
Quantos dos professores que faltam têm estes horários violentos completamente drenantes de toda a energia física e mental e inaguentáveis?
Quantos têm estes horários e moram a centenas quilómetros e três transportes públicos de distância da escola?
Quantos têm estes horários e estão colocados em duas ou três escolas ao mesmo tempo e têm de andar a correr de uma para a outra com trabalho sobreposto?
Quantos têm estes horários e são doentes e não se podem dar ao luxo de pôr baixa de longa duração porque isso lhes come 30% de um salário já baixo que precisam para se tratar?
Quantos têm horários esburacados e estão na escola o dia todo para depois irem para casa fazer a imensidade de trabalho que um professor faz em casa? (e não, não podem fazer na escola porque não têm condições - não há internet, o ruído é constante, não têm um gabinete de trabalho, a escola é gelada, etc.)
Quantos têm pais envelhecidos e doentes e não têm ninguém que possa cuidar deles?
Quantos estão com horas extraordinárias em cima de horários já carregados de turmas e com idades avançadas?
Quantos têm turmas com alunos agressivos e estão sozinhos a enfrentar a situação, dia após dia?
Quantos têm turmas com pais agressivos que todos os dias lhes corroem o trabalho e as energias ou até vão à escola ameaçá-los ou agredi-los?
Quantos estão em escolas com directores e chefes autoritários a sofrer bullying todos os dias e em situação de depressão ou burnout?
Quantos queriam fazer greve mas não podem porque um dia de salário já lhes faz diferença ao fim do mês?
JMT não sabe nem quer saber. JMT sempre usou a sua voz no jornal para demonizar professores. Nunca se lembrou de tentar contribuir para soluções ou, pelo menos, chamar a atenção para as causas do problemas. Talvez pense que se disser muito mal dos professores os problemas desapareçam, por milagre. Só que não. Ainda se vão agravar mais, dado que este ministro quer sobrecarregar mais os professores com turmas e trabalho e em mais escolas ao mesmo tempo.
É isto que se está a passar na escola dos meus filhos
João Miguel Tavares
Todos os dias faltam, em média, 11 mil professores e a cada ano há cerca de dois milhões de aulas que ficam por dar. Imaginem a desigualdade que isto cria entre a escola pública e a escola privada.
O problema não está apenas no número de greves e nos docentes com baixas de longa duração. Está também nos professores que faltam consecutivamente jogando com os prazos legais que impedem a sua substituição. Na escola dos meus filhos há um caso absolutamente extraordinário de uma professora de Francês que é a rainha do absentismo com justificação legal: falta e falta e falta, mas com o cuidado de regressar sempre no limite do prazo que impede a direcção da escola de requisitar novo professor. Mete baixa duas semanas, reaparece para dar uma aula ou duas, e depois volta a meter baixa. E assim sucessivamente, durante todo o ano lectivo, desde pelo menos 2018.
Convém lembrar que esta é a desgraçada geração covid, com programas de recuperação de aprendizagem sempre prometidos e nunca realizados. É revoltante ver os miúdos que já tanto perderam a não poderem fazer um teste para o qual estudaram empenhadamente, porque o professor faltou ou a escola fechou. Nunca, mas nunca, teremos um ensino público a sério, enquanto os direitos dos professores e dos funcionários se sobrepuserem diariamente ao mais fundamental dos direitos de um aluno – poder entrar numa escola, ter aulas e aprender.
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