Bélgica investiga subornos a eurodeputados para divulgar propaganda da Rússia
A desinformação estava a ser propagada online no site Voice of Europe e estarão envolvidos eleitos ao Parlamento Europeu originários da Bélgica, França, Alemanha, Hungria, Países Baixos e Polónia.
A justiça da Bélgica abriu uma investigação sobre a “interferência” russa no Parlamento Europeu, após alegações de que eurodeputados foram pagos para divulgar propaganda do Kremlin, anunciou esta sexta-feira primeiro-ministro belga. Um processo que surge a menos de dois meses das eleições europeias. “As nossas autoridades judiciais confirmaram agora que esta interferência está sujeita a processo”, explicou Alexander De Croo. “Os pagamentos em dinheiro não ocorreram na Bélgica, mas a interferência sim. Como a Bélgica é a sede das instituições da União Europeia, temos a responsabilidade de defender o direito de todos os cidadãos ao voto livre e seguro”.
O líder do governo da Bélgica, país que até ao final de junho está a presidir ao Conselho da União Europeia, adiantou ainda que este assunto será discutido no Conselho Europeu marcado para quarta e quinta-feira da próxima semana. Segundo De Croo os objetivos “claros” de Moscovo são “ajudar a eleger mais candidatos pró-Rússia para o Parlamento Europeu e reforçar a narrativa pró-Rússia naquela instituição”.
O Ministério Público Federal da Bélgica confirmou à AFP que a investigação sobre indivíduos ou organizações estrangeiras suspeitas de fazerem “doações, empréstimos ou dar vantagens” para ganhar influência começou esta quinta-feira. O crime acarreta penas que variam de seis meses a cinco anos de prisão e multas entre os mil e os 20 mil euros.
Há cerca de um mês, a República Checa já havia dito que o seu serviço de inteligência tinha descoberto uma rede que usava legisladores da União Europeia para espalhar propaganda russa através do site de notícias Voice of Europe, com sede em Praga. Agora, a Bélgica afirma que os seus próprios serviços determinaram que alguns dos eurodeputados foram pagos para promover a propaganda de Moscovo.
“Se houver algum tipo de suborno - e os nossos serviços indicam que houve pagamentos - embora sejam necessários dois lados para que isso aconteça, há pessoas que organizam isso, mas também há pessoas a recebê-lo”, prosseguiu De Croo.
Os eurodeputados estão obrigados a seguir regras rigorosas em matéria de independência e ética e podem enfrentar sanções - financeiras e outras - se as violarem. O grupo dos Verdes no Parlamento Europeu e um diário checo avançaram que os eurodeputados sob suspeita são originários da Bélgica, França, Alemanha, Hungria, Países Baixos e Polónia.
Derrota da Ucrânia
O site Politico noticiou esta semana ter identificado 16 eurodeputados que apareceram no Voice of Europe, todos eles políticos de extrema-direita. “Se for uma guerra de civilização, bem, espero que a civilização na Ucrânia perca”, disse Marcel de Graaff, um eurodeputado neerlandês de extrema-direita, num estúdio de televisão dentro do Parlamento Europeu, em outubro passado, segundo o Politico. “A Ucrânia tem de se tornar uma zona tampão desmilitarizada”, argumentou Maximilian Krah, um político de extrema-direita da Alemanha, dirigindo-se aos outros quatro participantes de um debate organizado pelo Voice of Europe
Já o jornal checo Denik N e a revista alemã Der Spiegel nomearam dois dos principais candidatos alemães do partido de extrema-direita Alternativa para a Alemanha (AfD), Petr Bryston e Maximilian Krah, como políticos suspeitos de receberem fundos russos para divulgar os pontos de discussão do Kremlin. Os dois negaram ter recebido qualquer pagamento, mas o Denik N noticiou que os serviços secretos checos tinham uma gravação de áudio implicando Bryston.
Alexander De Croo afirmou também que a Bélgica iria promulgar ainda esta semana uma nova lei contra este tipo de interferências e apelou à criação de mais ferramentas a nível da União Europeia para combater a propaganda e a desinformação russas. Sugeriu ainda que os procuradores belgas deveriam solicitar uma reunião urgente da agência Eurojust, que trata da cooperação jurídica transfronteiriça dentro da UE.
A República Checa colocou o Voice of Europe e dois ucranianos pró-Kremlin - Viktor Medvedchuk (um dos líderes do Voice of Europe e próximo de Putin) e Artem Marchevsky - na sua lista de sanções em relação às atividades da rede pró-Rússia. O Voice of Europe disse estar a ser “estigmatizado de forma injusta e implacável”, juntamente com “agricultores europeus, partidos anti-globalistas em ascensão política, apoiantes destes partidos, o antigo presidente dos EUA Donald Trump e o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán”.
Eleitos detidos no Qatargate
A revelação deste caso faz lembrar o “Qatargate”, denunciado em dezembro de 2022, no qual vários eurodeputados foram acusados de serem pagos para promover os interesses do Qatar e de Marrocos, alegações negadas pelos dois países.
A primeira afetada foi a então vice-presidente do Parlamento Europeu, a socialista grega Eva Kaili, detida em flagrante delito. Também o ex-eurodeputado socialista italiano Pier Antonio Panzeri, considerado o cabecilha do esquema, foi detido, tendo entretanto feito um acordo para colaborar com a investigação judicial belga, em troca de uma redução da sentença. No rol dos detidos estão ainda o companheiro de Kaili, o lobista Niccolò Figa-Talamanca, o eurodeputado italiano Andrea Cozzolino e o belga Marc Tarabella.
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