Novo ano, erros velhos
Está errada a actual imposição de uma “pedagogia de Estado” que tem vindo a transformar professores em agentes funcionalizados de ensino, quando eles devem ser autores, sublinho, autores, de ensino.
Santana Castilho
No começo de um novo ano escolar, pareceu-me que podia fazer sentido falar de coisas que, sendo essenciais, vão passando ao lado do debate político. Com efeito, a vertente forte da contestação dos professores tem-se cingido à recuperação do tempo de serviço e a outros temas relacionados com a carreira.
A Educação é um serviço público e o direito de todos à Educação é um dos pilares fundamentais do Estado de direito. Mas o Estado tem falhado na regulação da Educação, particularmente no que à sua qualidade respeita e na protecção daqueles que têm mais vulnerabilidades socioeconómicas.
Tenho escrito repetidas vezes que educar é uma arte, que não uma ciência. Métodos e doutrinas pedagógicas não são cientificamente demonstráveis como correctos ou incorrectos, em termos absolutos.
O que resultou num determinado contexto, com determinados alunos, professores ou escolas, pode não resultar em contexto diferente. É por isso que está errada a actual imposição de uma “pedagogia de Estado”, que tem vindo a transformar professores em agentes funcionalizados de ensino, quando eles devem ser autores, sublinho autores, de ensino. O voto confere legitimidade democrática. Mas não confere autoridade pedagógica.
O Currículo Nacional não pode continuar a ser esquartejado. Obrigatoriamente deve conter conhecimentos estruturantes (Língua Materna, uma ou várias Línguas Estrangeiras, Literatura, Filosofia, História, Geografia, Matemática, Ciências Naturais, Música, Artes e Educação Física e Desporto). A estas áreas acrescerão disciplinas “qualificantes”, consoante a diversidade dos diferentes cursos.
Os responsáveis têm promovido a “inovação” a uma espécie de Deus ex machina. Ora o que interessa não é se a intervenção é tradicional ou inovadora, mas sim se resulta ou não. Vivemos num autêntico vórtice de “inovações” não testadas, impostas centralmente a quem sobre elas devia decidir, isto é, o professor. Só que os clássicos teoremas matemáticos tanto se ensinam usando os modernos quadros digitais interactivos, como usando o velho quadro negro e um pau de giz.
Em contraste com os erros enunciados, imagine que reduzíamos o número de alunos por turma, digamos que a um máximo de 20. É minha convicção que melhorava substancialmente a aprendizagem e a disciplina. Do mesmo passo, se diminuíssemos a carga horária global dos alunos, libertando tempo para o estudo acompanhado por professores e para o desporto organizado, melhorávamos a sua saúde, protegíamos as actividades socializantes próprias da infância e da adolescência, que agora não têm, e defendíamos os que não podem pagar explicações, promovendo o verdadeiro sucesso escolar. Por outro lado, se o actual Estatuto do Aluno, indutor de facilitismo e de direitos sem deveres, fosse substituído por outro, assente na promoção de princípios éticos e morais, que consagrasse o aprender como o primeiro dever do aluno, reforçaríamos vigorosamente o processo de construção de cidadãos íntegros e devolveríamos a autoridade aos professores e às escolas.
Se libertássemos os professores da alienação burocrática em que vivem e extinguíssemos o kafkiano modelo de avaliação, desadequado e pejado de grosseiros erros técnicos, o corpo docente rejuvenescia. Se reformássemos radicalmente os concursos de recrutamento e colocação de docentes, com uma intervenção corajosa e tecnicamente possível, mas nunca até hoje assumida, pôr-se-ia fim à decantada instabilidade profissional e familiar de quem ensina, com incomensuráveis benefícios para os alunos.
Se as escolas passassem a ser governadas por um novo modelo de gestão, verdadeiramente democrático, e jamais fosse possível atribuir-lhes uma só nova tarefa sem o reforço dos recursos humanos e materiais necessários, a produtividade aumentava e removeríamos a politização perniciosa, o centralismo asfixiante e a conflitualidade desagregadora.
Por fim, tal como não se pode outorgar aos professores responsabilidades sem lhes conferir autoridade, tão-pouco se pode dispensar os pais do dever de educar os filhos. A vida dura dos pais e os seus absorventes deveres laborais não os podem alhear do valor mais alto a que devem responder: educar os filhos. O Estado tem de responsabilizar os pais pelos comportamentos dos filhos, sempre que estes geram a indisciplina e prejudicam a paz nas escolas.
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