As letras pequenas das promessas socialistas para a Margem Sul
“Em lado algum do artigo escrito pelo primeiro-ministro, existe compromisso relativamente às pontes Barreiro-Seixal, e Barreiro-Montijo terem de ser rodoviárias”
Ivan Gonçalves
Deputado do PS por Setúbal, Política Local, Popular FM, 13 de Maio
É com relativa surpresa, mas não total, que começamos a perceber que a enorme propaganda que trouxe o governo socialista ao Barreiro para anunciar grandes obras para o distrito de Setúbal, e uma nova era de grande modernização de infra-estruturas, é, afinal, um compromisso com uma série de pequenas cláusulas, à semelhança do que vemos em algumas campanhas de saldos, onde muitas vezes, afinal, não existe grande promoção ou produto com a qualidade anunciada. Com o actual governo, a agenda é essencialmente da narrativa política que permita manter a ilusão de uma “dinâmica esbracejante” junto do eleitorado, e isto é o conceito de governo mais próximo que alguma vez os portugueses vão ter direito.
Recordemos então os factos. No final de Março, o Governo realizou, no distrito de Setúbal, uma pomposa reunião do Conselho de Ministros, onde trouxe ao de cima promessas e ambições antigas para a península de Setúbal - ligações rodoviárias e ferroviárias que trouxessem mais e melhor mobilidade para o distrito. O próprio primeiro-ministro, António Costa, em artigo no jornal “O Setubalense” assegurava que “Chegou a hora de Setúbal”. Nesse artigo, o primeiro-ministro prometia, entre outros, “a concretização de projectos para a construção de novas ligações entre o Barreiro e o Montijo e o Barreiro e o Seixal”. Ao longo dos dois dias que passou no distrito, todas as intervenções dos membros do Governo, acolitados pelos autarcas e deputados do PS, fizeram crer à população do distrito que finalmente iríamos ter as prometidas pontes rodoviárias Barreiro-Seixal e Barreiro-Montijo.
Cerca de mês e meio depois da campanha de propaganda, que tanta expectativa criou junto das populações, e – sem qualquer auscultação junto das restantes forças políticas, o que é estranho, dado ser um investimento que, sem dúvida, é estruturante, ao nível da localização do novo aeroporto, onde o PS frequentemente se socorre dos restantes partidos para firmar uma posição – veio finalmente o contrato das propostas, ou seja a Resolução do Conselho de Ministros (RCM) n.º 41/2023.
E aqui é que começamos a encontrar as discrepâncias entre promessa e realidade dos factos. Ou seja, as letras pequenas das promessas socialistas. Nesta resolução, onde o Governo aprovou um conjunto de medidas tendo em vista a concretização do Projecto do Arco Ribeirinho Sul (ARS), o executivo compromete-se a “definir os eixos estratégicos fundamentais de desenvolvimento” para o ARS, designadamente a “criação de novos eixos de acessibilidade, nomeadamente uma via de ligação entre todo o território abrangido pelo Projecto ARS, incluindo a edificação de pontes pedonais e cicláveis entre Barreiro-Montijo e Barreiro-Seixal.
Ou seja, das prometidas e desejáveis pontes rodoviárias, que são as que podem efectivamente melhorar e resolver os problemas de mobilidade das populações dos municípios da Margem Sul, que vivem numa espécie de beco entre si com vista para Lisboa, passamos aparentemente para pontes pedonais e cicláveis, que não resolvem nenhum problema estrutural de mobilidade para os municípios a sul do Tejo. Esta foi, aliás, uma das razões apresentadas pela autarquia socialista do Barreiro para cancelar a construção pedonal e ciclável entre Barreiro-Seixal em 2018.
Na sequência da apresentação deste relatório, tem havido reacções dúbias por parte de vários responsáveis políticos socialistas do distrito, que confirmam uma certeza: a de que não sabem o formato final do que prometeram aos habitantes da Margem Sul, e dos municípios do Seixal, Barreiro e do Montijo – onde são inclusivamente poder autárquico nestes dois últimos municípios.
É um claro embraço político para deputados e autarcas socialistas, que depois de tanto darem a cara por este governo e por este primeiro-ministro, descobrem da pior maneira que, para o PS, Setúbal e a Margem Sul são e serão sempre uma espécie de deserto político, como Mario Lino o definiu há muitos anos, aquando das primeiras discussões sobre localização do aeroporto – e veremos se, também neste campo, o “jamais” não se materializará relativamente a este tema. Afinal, estas duas infra-estruturas são cruciais para interligar os municípios a sul que dariam cobertura e suporte logístico ao novo aeroporto, caso seja decidido que é a sul do Tejo – Montijo ou Alcochete. O silêncio ensurdecedor sobre este tema por parte do Governo deve também deixar os habitantes da Margem Sul atentos, por mais letras pequenas nas promessas deste governo socialista.
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