Ontem, numa aula, um aluno perguntou-me, a propósito de uma passagem do Discurso do Método onde Descartes diz que houve uma altura da sua vida em que se encontrava na Alemanha e passava os dias sozinho, em casa, aquecido, a pensar, 'Descartes não trabalhava? Ele vivia do quê?' Bem, ele foi militar e vivia de uma pensão dos militares. 'Ah, diz logo outro, eu também queria que me pagassem uma pensão para poder não trabalhar e passar os dias a pensar'. Tive que explicar: 'Pensar é muito difícil. Em primeiro lugar é preciso ter muitos e bons conhecimentos sobre os assuntos e em segundo lugar, quando começamos a pensar nos problemas, damo-nos conta de que há tantas variáveis complexas que é muito difícil ser capaz de destrinçar os nós dos problemas, ordená-los com coerência, com eficácia e com produtividade. Veja o caso dos problemas da educação. Como as coisas pioram e há 500 opiniões contrárias sobre tudo e mais alguma coisa, pela razão de os governantes chegarem aos cargos sem terem bons conhecimentos, nem saberem pensar sobre o assunto. Ora, Descartes usou esses tempos de isolamento para pensar como construir um conhecimento útil, produtivo e com certezas impermeáveis ao cepticismo paralisante - e o seu pensamento mudou o mundo. E se hoje temos a ciência e a tecnologia com avanços surpreendentes, devemo-lo, em muito grande parte, ao que ele produziu nesses anos de pensamento'. Diz o aluno, 'mas então, se pensar é assim tão importante, porque é que não se valorizam as pessoas que se dedicam ao trabalho de pensar e fazer avançar os conhecimentos?' - Talvez porque toda a gente pensa que sabe pensar e sabe mais que os outros...? Porque o poder cega e dá às pessoas uma ilusão de inteligência e saber...? Pergunta: 'E como é que sabemos que sabemos pensar ou não sabemos pensar?' -Bem, para saber se está a pensar bem, tem que fazer um esforço de melhorar os conhecimentos, ter a certeza de que tem razões e fundamentos para as suas posições, rever os conhecimentos (estudar e ler outras opiniões é uma maneira de descobrir erros nas nossas ideias), pôr à prova as suas ideias (em termos teóricos e práticos) e ver se os resultados são positivos ou negativos e, se possível, ter um bom método de pensar e é aqui que entra o Descartes e o seu método' - Ah, pois, estudar... diz ele.
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