February 19, 2023

Evolução dos horários dos professores




Um horário do secundário, a título de exemplo, em 2005 (o 1º que aparece) e em 2010/11 e que ainda vigora (o 2º que aparece).

São horários completos, sem reduções ao abrigo do artº 79 (a partir de uma certa idade, que agora são os 45 ou 50 anos, tem-se menos horas lectivas que são convertidas em trabalho não lectivo - embora possam ser de trabalho lectivo ao qual mudaram o nome para nos tirarem esse direito, como é o caso das aulas de apoio...)

O horário do professor é contado em tempos lectivos. Todos os outros trabalhos, Não lectivos não são contabilizados como trabalho, nem são pagos. Porém, são obrigatórios e sujeitos a faltas.

Dantes, o horário lectivo abrangia os apoios ao estudo, que são aulas de explicação dadas a um grupo pequeno de alunos com vários problemas/dificulades - agora deixou de abranger e essas aulas são consideradas, não-aulas. Também a tutoria é considerada trabalho não lectivo , bem como cargos pedagógicos que tinham alguma redução da componente lectiva e agora não têm, excepto uma parte da DT.

Os trabalhos Não Lectivos, obrigatórios, que são marcados no horário do professor em Setembro, estão a itálico, bem como o trabalho individual que inclui estudo, formações, preparação de aulas, avaliação, elaboração de fichas e testes, preparação de visitas de estudo, aulas práticas, debates, etc)

O ME só contabiliza, para efeitos de pagamento, o horário lectivo que tem 22 horas semanais.
 


Portanto, temos aqui um horário com 4 turmas, cada uma com 4 horas semanais + 2 horas de um cargo pedagógico + 1 DT + 2 horas de apoio lectivo, num total de 22 horas lectivas, a que se acrescenta as 8 horas de TI que o ME entende que chegam (mas não chegam), formações e outros trabalhos que não são os mesmos todas as semanas, mas que todas as semanas preenchem o horário. Repare-se que a burocracia é irrelevante, nem aparece.

Legenda para os dois exemplos:

L = Lectivo (equiparado a uma aula)

NL = Não Lectivo (não conta para o ME, embora seja obrigatório e sujeito a faltas)

Apoio = explicações dadas a um grupo pequeno de alunos com problemas vários. Deixou de ser lectivo.

TI = trabalho individual (Não Lectivo)

B = burocracias (Não Lectivo)

F = Formação (formações creditadas, obrigatórias para subir nos escalões da carreira)

RP = Reunião de Pais

RI = Reuniões intercalares



DTL = Direcção de Turma (tempo ) Lectivo

DTNL = Direcção de Turma (tempo ) Não Lectivo

Apoio L = Lectivo

Apoio NL = Apoio Não Lectivo

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Agora repare-se no horário nº 2, que é o mesmo horário, uns anos mais tarde, com 22 horas lectivas, mas com as mudanças entretanto introduzidas de só se considerar lectivo, a atribuição de turmas:

Passou a ter 5 turmas em vez de 4 (o que implica um acréscimo grande de trabalho individual); + 1 DT  e tem 4 horas de aulas de Apoio ao estudo em vez das 2 que tinha (o dobro), pois uma vez que passaram a ser consideras Não Lectivas, pode-se encher o professor de aulas de apoio que não entram na contabilidade do horário lectivo.

Todo o resto do trabalho, nomeadamente o TI, mas também reuniões intercalares e formações é feito à noite ou no fim de semana, em muito maior número que 8 horas semanais. A burocracia ocupa uma parte grande do tempo.




Uma mancha horária que era sobretudo numa parte do dia (se o horário estivesse bem feito), sendo a outra parte para os cargos, projectos, clubes, reuniões, formação e trabalho individual, é agora cheia de trabalho lectivo a que se chama Não lectivo e burocracias. As formações, todo o trabalho individual, as reuniões de pais e as reuniões intercalares (que se prolongam por um mês inteiro), é tudo feito em horário pós-laboral, à noite ou ao fim-de-semana. Nem sequer pus aqui, neste horário as 2 ou 3 reuniões que muitos professores têm, por dia! Reuniões de grupo, de departamento, de planificação, de avaliação, de provas conjuntas, de preparação de actividades, de preenchimento de grelhas... fui muito poupadinha, porque há muito trabalho desse que a maioria dos professores faz e eu já não faço, por causa da doença.

Este acréscimo de trabalho foi acompanhado de congelamento de salários, de aumentos de 0, qualquer coisa % (os professores perderam 20% de poder de compra), de aumentos de custos com a profissão: deslocações para muito longe, aluguer de casas/quartos, material de trabalho digital, etc.

É preciso notar que dezenas de milhar de professores cumprem este horário a 50, 100 ou 200 km de casa ou em 2 escolas, ou até 3 escolas e não chegam a casa às 7 da tarde para fazerem todo o resto do trabalho individual, mais as formações. E nesses casos, o trabalho de burocracia aumenta brutalmente ao que aqui considerei pois é o de 2 ou 3 escolas. 

Outra mudança introduzida no horário lectivo foi tirar-nos o intervalo de pausa, geralmente de10 m entre aulas (as aulas são dadas em blocos de duas de cada vez). As aulas, que eram contadas em horas, agora são contabilizadas em minutos e o professor, a partir do 7º ano de escolaridade, tem de dar ao Estado 1100 minutos de aulas por semana, o que significa que a pausa entre aulas não é contabilizada como fazendo parte do horário laboral. Não temos direito a pausas. Quando toca à saída e até tocar à entrada, o ME considera que estamos de férias. Isto, apesar dos intervalos servirem para resolvermos muito problemas de trabalho, porque apanhamos ali os colegas à mão para resolver aquelas mil e uma coisas de alunos que se resolvem melhora cara a cara, mas não carecem de reuniões formais.

Penso que no governo, para se convencerem, a si e aos outros, que é bom pagar mal aos professores, mostram uns aos outros horários de professores já com uma certa idade e, por isso, com reduções de componente lectiva, só com as turmas e ainda sem o resto do trabalho atribuído, marcado no horário.
 
Repare-se que um professor de 55 anos ou 60 (com redução de componente lectiva) pode ter só 4 turmas e, embora o resto do horário esteja preenchido e cheio de tarefas, como passaram todas a ser consideradas não lectivas, não aparecem no horário no início do ano, quando ele nos é dado, nem nos horários oficiais. Só lá aprecem as turmas. São acrescentadas no horário ao longo de Setembro, porque muitas delas implicam coordenação entre o horário dos professores e dos alunos - os clubes, a sala de estudo, os apoios - que têm se ser coordenados com os horários dos professores que fazem parte desses grupos e com os alunos em questão. A mesma coisa com as reuniões de toda a ordem.

Portanto, quando é mostrado o horário só com as turmas e mais nada, antes de se marcar tudo o resto NL que é obrigatório, parece pouco trabalho. No caso deste horários de exemplo que aqui pus, é olhar para o 1º horário e tirar-lhe tudo menos as turmas. Ficam lá 16 horas de aulas com turmas atribuídas. Parece pouco porque falta lá muito. 

O ministro da educação e o primeiro-ministro sabem que não é assim... no entanto, fingem que é para poderem considerar que esta profissão é um privilégio em que não se faz nada, de maneira que até querem precarizá-la ainda mais. Pôr todos os professores, mesmos os que já estão efectivos numa escola, a andar de um lado para o outro, segundo os interesses dos directores e fazer de maneira que só cheguem ao meio da carreira.

Como foi que disse o 1º ministro na entrevista da TVi, com uma enorme deselegância: 'Disseram a esses aí que iam ter uma carreira de luxo...' é uma total falta de respeito e de decência.

Segundo o primeiro-ministro e o ME, os professores são privilegiados, mas a questão é explicar: se assim é, então,

PORQUE É QUE NINGUÉM QUER SER PROFESSOR 

PORQUE É QUE ESTÃO DEZENAS DE MILHAR DE ALUNOS SEM PROFESSOR

PORQUE É QUE NO PRÓXIMO ANO LECTIVO VÃO ESTAR 250 MIL ALUNOS SEM PROFESSOR

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