Putin ter mandado Lakrov à China é bom, porque a China não tem tradição de ter líderes lunáticos para fora. São mais do género de massacrar o próprio povo, mas são muito cuidadosos e pragmáticos quanto à intervenção no mundo, de maneira que ter alguém capaz de realmente influenciar Putin, agora que ele precisa da China e tem que ouvi-la, é bom. É melhor do que ele estar completamente isolado, sem ouvir nenhuma voz contrária à sua fixação (os que desviam são traidores) na narrativa de propaganda que conta aos russos: queríamos ser amigos do ocidente, eles não quiseram e agora a Ucrânia que está cheia de nazis e queria entrar na NATO e depois iam ter armas aqui à porta de maneira que não tivemos outra opção senão ir lá salvar o mundo daquela gente.
Na realidade Putin quer ser um grande actor na cena mundial e hoje voltou a dizê-lo: ele e a China serão um polo mandante, o outro será os EUA (que ele vê a caminho do autoritarismo) e o outro logo se vê. Porém, a Europa com os seus valores de direitos humanos e democracias pluralistas têm que ser esmagada até à irrelevância.
Hoje Lakrov e o homólogo chinês anunciaram uma nova ordem mundial em que ambos são um polo de democracia no mundo. Assim que dizem esta frase em que se declaram construtores de democracias, sabemos que estão num caminho de mentira. Nós sabemos, eles sabem que sabemos. No entanto, enquanto se entretêm com isto e Putin vê uma luz ao fundo do túnel para não ficar sozinho no mundo apenas com a Venezuela e a Coreia do Norte e pouco mais, há esperança que os chineses o acalmem. E que os russos façam qualquer coisa, um golpe, quero eu dizer.
Ao que parece já ninguém se consegue aproximar dele e ninguém também se vai embora ou demite porque isso é correr risco de vida. Há um grande número de russos jovens que estão revoltados contra as sanções do Ocidente porque baixaram o nível de vida, não conseguem sair de lá e as perspectivas de futuro ficaram muito sombrias. Não percebem porque esta guerra não pode ser como as outras da Chechenia, da Geórgia e da Crimeia em que o Ocidente fala mas não faz nada e deixa que continuem a ter uma vida e colaboração internacionais: no desporto, nas artes e cultura, nos negócios, etc. Estão revoltados [/now-were-going-to-fck-them-all] Outro dia vi uma influencer russa no novo canal YouTube russo: tinha 28 seguidores. Estava habituada a ter no YouTube umas dezenas de milhar. Queriam que fosse business as usual.
Porém, o cerne da questão é esse: os russos elegeram este tipo e deixaram que ele se perpetuasse no poder, prendesse opositores, censurasse os meios de comunicação social e fechasse a sociedade e agora não podem dizer que não têm nada que ver com Putin e que querem estar na boa porque não quiseram nem querem a guerra, porque há um país que foi invadido, está a ser destruído e as pessoas estão a morrer e eles têm responsabilidade porque deixaram Putin perpetuar-se no poder. Em outros países como os EUA, as pessoas protestam, vão para as ruas e se nada resulta, ao fim de 4 ou 8 anos mandam fora o tipo que está no poder e escolhem outro, mas quando se deixa um tipo ficar eternamente no poder, depois não se pode dizer que não têm nada a ver com isso. Arca-se com as consequências - por isso, nas ditaduras, a única maneira de mudar o tipo do poder é com um golpe palaciano ou uma revolta popular.
Mas esta guerra é diferente das outras guerras locais anteriores onde o grau de hipocrisia internacional decidia o vencedor da guerra, mais que as tropas no terreno. Havia declarações de separatismo ou de ataques ao poder instituído, transferiam-se russos para as regiões, fabricava-se um referendo, a comunidade internacional assobiava para o lado e os países acabavam por ceder território porque percebiam que estavam sozinhos e não iam ter ajuda. Deste vez não foi assim, em grande parte por conta do presidente ucraniano e do povo que não abdica do seu território. Obrigaram os russos a esforçar-se e os ocidentais a olhar. E desta vez houve suporte.
Se isto acabar bem e rapidamente, poderá haver um novo padrão de procedimento internacional a impedir agressões arbitrárias imperialistas no mundo, sem se chegar à guerra. Isso seria um grande avanço na relação de paz entre os povos.
É uma pena que Guterres esteja inactivo. É uma pessoa sem recursos pessoais, sem expediente. Esta era uma oportunidade para a ONU mostrar que a união das nações não é uma formalidade em vias de extinção, mas uma ideia consequente. O que está ele a fazer? Que saibamos nada de relevante.
Também é uma pena que Bush, o filho, não tenha sido acusado e julgado, com os outros que fabricaram as mentiras e a propaganda acerca das armas de destruição que levou o exército americano a invadir o Iraque e a instabilizar a região. Tinha-se poupado muito disto. Estou convencida que Putin viu nisso um precedente de violação do direito internacional e um modelo de acção, que seguiu.
A Europa tem de resguardar-se porque não se sabe quem é o próximo presidente dos EUA e se será outro proto-ditador como Trump. Trump atirou o Irão para os braços dos russos. Mike Pence anunciou que vai candidatar-se...
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