Pelo fim dos diáconos da distopia pedagógica
Santana Castilho
A 16 de Janeiro “abre” a campanha eleitoral para as legislativas de 30. Desejo muito que os programas partidários expressem as suas propostas com clareza, porque a situação actual do sistema de ensino é preocupante. Aqueles que generosamente me têm lido ao longo dos tempos terão presentes os problemas que fui equacionando. De entre tantos, é imperioso que os partidos digam agora, pelo menos, o que tencionam fazer para varrer a carga de burocracia controladora que se abateu sobre as escolas e sobre os professores; que medidas propõem para acudir à falta de professores, designadamente para reconhecer a importância social que lhes é devida; se sim ou não tencionam rever o estatuto da carreira docente, particularmente os instrumentos de avaliação do desempenho; se substituirão o modelo de gestão das escolas e de organização de toda a rede escolar; se introduzirão ordem e coerência em todo o edifício curricular; como encaram a autonomia das escolas e a municipalização da educação; que estratégia reservam para obstar à indisciplina que grassa nas escolas; se acham, sim ou não, necessário rever a Lei de Bases do Sistema Educativo; se tencionam universalizar todo o pré-escolar até à entrada no básico; se aceitam reduzir o número de alunos por turma e fixar o máximo de alunos por professor.
A regressão é evidente e só o ministro a não vê. Com milhares de alunos continuadamente sem aulas, estamos a voltar ao ambiente dos primeiros anos da democracia, quando a explosão da procura de educação nos confrontou com a falta de professores qualificados.
O cenário de falta grave de professores começou a ser apresentado por muitos, de há muito. Os do terreno identificaram-no cedo. Os da baixa política descobriram-no agora, de grande que ficou, enquanto ao longo dos últimos seis anos o ignoraram sistematicamente, com inépcia. Com efeito, foi neste quadro que surgiu uma caricata task-force, constituída por membros das direcções-gerais (Direção-Geral de Estabelecimentos de Ensino e Direção-Geral da Administração Escolar), que de há muito existem para, entre outras funções, obstar a que o problema surgisse. Se por hipótese os destinos da Educação continuarem entregues aos mesmos depois de 30 de Janeiro, não me admirarei de ver os fins a terraplanar os meios, prescindindo o sistema das habilitações definidas para leccionar, aumentando o número de alunos por turma, abolindo as reduções devidas à idade e, no limite, abolindo mesmo a componente não lectiva dos horários docentes.
Há seis anos que venho denunciando os sinais da distopia pedagógica que o PS abraçou, particularmente a ideia dissimulada de que são os alunos que devem orientar a sua educação, mediante metodologias de descoberta, e não os professores, segundo o tradicional ensino directo. As normas que presidem hoje à avaliação dos alunos estão vocacionadas para valorizar qualquer coisa que eles aprendam, por irrelevante que seja, depreciando em absoluto o que não aprenderam e deviam ter aprendido. E os diáconos destas doutrinas avaliativas têm propalado bem a mensagem, em autênticos guias espirituais de “boas práticas” docentes.
Naturalmente que o ambiente em que a sociedade portuguesa está mergulhada favorece a atitude prevalecente no Ministério da Educação, qual seja a de negar a realidade, em vez de acolher as propostas que ajudariam à solução dos problemas. Com efeito, anestesiados pelo medo, vamos esquecendo a gravidade de vivermos há quase dois anos em verdadeiro estado de excepção, com direitos e liberdades drasticamente limitados. Primeiro foi um estado de emergência prorrogado durante meses, ao arrepio grosseiro da sua constitucional natureza extraordinária e temporariamente limitada. Agora são simples resoluções do Conselho de Ministros que, cilindrando o normal funcionamento do Estado de direito, anunciam fins (sucessivamente falhados) para justificar o uso de quaisquer meios. Cumulativamente, a pouco mais de um mês das eleições, com a Assembleia da República dissolvida, aprovam-se diplomas que estabelecem estratégias nacionais de actuação futura. Sim, o fomento do medo vem tornando a sociedade num objecto totalmente dependente do poder político e coercivo que António Costa sobre ela exerce.
In “Público” de 22.12.21
O cenário de falta grave de professores começou a ser apresentado por muitos, de há muito. Os do terreno identificaram-no cedo. Os da baixa política descobriram-no agora, de grande que ficou, enquanto ao longo dos últimos seis anos o ignoraram sistematicamente, com inépcia. Com efeito, foi neste quadro que surgiu uma caricata task-force, constituída por membros das direcções-gerais (Direção-Geral de Estabelecimentos de Ensino e Direção-Geral da Administração Escolar), que de há muito existem para, entre outras funções, obstar a que o problema surgisse. Se por hipótese os destinos da Educação continuarem entregues aos mesmos depois de 30 de Janeiro, não me admirarei de ver os fins a terraplanar os meios, prescindindo o sistema das habilitações definidas para leccionar, aumentando o número de alunos por turma, abolindo as reduções devidas à idade e, no limite, abolindo mesmo a componente não lectiva dos horários docentes.
Há seis anos que venho denunciando os sinais da distopia pedagógica que o PS abraçou, particularmente a ideia dissimulada de que são os alunos que devem orientar a sua educação, mediante metodologias de descoberta, e não os professores, segundo o tradicional ensino directo. As normas que presidem hoje à avaliação dos alunos estão vocacionadas para valorizar qualquer coisa que eles aprendam, por irrelevante que seja, depreciando em absoluto o que não aprenderam e deviam ter aprendido. E os diáconos destas doutrinas avaliativas têm propalado bem a mensagem, em autênticos guias espirituais de “boas práticas” docentes.
Naturalmente que o ambiente em que a sociedade portuguesa está mergulhada favorece a atitude prevalecente no Ministério da Educação, qual seja a de negar a realidade, em vez de acolher as propostas que ajudariam à solução dos problemas. Com efeito, anestesiados pelo medo, vamos esquecendo a gravidade de vivermos há quase dois anos em verdadeiro estado de excepção, com direitos e liberdades drasticamente limitados. Primeiro foi um estado de emergência prorrogado durante meses, ao arrepio grosseiro da sua constitucional natureza extraordinária e temporariamente limitada. Agora são simples resoluções do Conselho de Ministros que, cilindrando o normal funcionamento do Estado de direito, anunciam fins (sucessivamente falhados) para justificar o uso de quaisquer meios. Cumulativamente, a pouco mais de um mês das eleições, com a Assembleia da República dissolvida, aprovam-se diplomas que estabelecem estratégias nacionais de actuação futura. Sim, o fomento do medo vem tornando a sociedade num objecto totalmente dependente do poder político e coercivo que António Costa sobre ela exerce.
In “Público” de 22.12.21
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