July 07, 2021

"E uma doçura inquieta chove no peito"

 


OS LIMÕES

Escuta-me, os poetas laureados
movem-se tão somente entre as plantas
de nomes pouco usados: buxos ligustros e acantos.
Eu, por mim, gosto de caminhos que levam às agrestes
valas aonde em poças
já meio secas rapazes apanham
alguma enguia miúda:
as veredas que seguem junto às bordas,
descem por entre os tufos de canas
e chegam até os hortos, no meio dos limoeiros.

É melhor quando a algazarra dos pássaros
se dilui e é tragada pelo azul:
mais claro se há de escutar o sussurro
de ramos amigos no ar que não se move quase,
e as sensações desse cheiro
que não se aparta da terra
e uma doçura inquieta chove no peito.
Aqui das distraídas paixões
por um milagre cala-se a guerra,
aqui até a nós pobres cabe nossa parte de riqueza
e é o aroma dos limões.

Vês, é nesses silêncios em que as coisas
se abandonam e como que estão prestes
a trair o seu último segredo,
que por vezes se espera
descobrir um engano da Natureza,
o ponto morto do mundo, o elo que não resiste,
a mecha a deslindar que enfim nos ponha
no âmago de uma verdade.
O olhar revista em torno,
a mente indaga reúne separa
no perfume que alastra
quando mais langue o dia.
São os silêncios em que se avista
em toda sombra humana que se afasta
alguma importunada Divindade.

Mas a ilusão falha e o tempo nos reporta
às ruidosas cidades onde o azul se mostra
só aos pedaços, no alto, entre as cimalhas.
A chuva cansa a terra, depois; cerra-se
o tédio do inverno sobre as casas,
a luz se torna avara — a alma amarga.
Quando um dia um portão entreaberto
em meio às árvores de um pátio
nos mostra os amarelos dos limões;
e o gelo do coração se desfaz,
e brotam em nosso peito
as canções que ressoam
dos seus clarins de ouro solar.

**************

I LIMONI

Ascoltami, i poeti laureati
si muovono soltanto fra le piante
dai nomi poco usati: bossi ligustri o acanti.
lo, per me, amo le strade che riescono agli erbosi
fossi dove in pozzanghere
mezzo seccate agguantano i ragazzi
qualche sparuta anguilla:
le viuzze che seguono i ciglioni,
discendono tra i ciuffi delle canne
e mettono negli orti, tra gli alberi dei limoni.

Meglio se le gazzarre degli uccelli
si spengono inghiottite dall'azzurro:
più chiaro si ascolta il susurro
dei rami amici nell'aria che quasi non si muove,
e i sensi di quest'odore
che non sa staccarsi da terra
e piove in petto una dolcezza inquieta.
Qui delle divertite passioni
per miracolo tace la guerra,
qui tocca anche a noi poveri la nostra parte di ricchezza
ed è l'odore dei limoni.

Vedi, in questi silenzi in cui le cose
s'abbandonano e sembrano vicine
a tradire il loro ultimo segreto,
talora ci si aspetta
di scoprire uno sbaglio di Natura,
il punto morto del mondo, l'anello che non tiene,
il filo da disbrogliare che finalmente ci metta
nel mezzo di una verità.
Lo sguardo fruga d'intorno,
la mente indaga accorda disunisce
nel profumo che dilaga
quando il giorno più languisce.
Sono i silenzi in cui si vede
in ogni ombra umana che si allontana
qualche disturbata Divinità.

Ma l'illusione manca e ci riporta il tempo
nelle città rumorose dove l'azzurro si mostra
soltanto a pezzi, in alto, tra le cimase.
La pioggia stanca la terra, di poi; s'affolta
il tedio dell'inverno sulle case,
la luce si fa avara - amara l'anima.
Quando un giorno da un malchiuso portone
tra gli alberi di una corte
ci si mostrano i gialli dei limoni;
e il gelo dei cuore si sfa,
e in petto ci scrosciano
le loro canzoni
le trombe d'oro della solarità.

—Eugenio Montale, em "Ossos de Sépia 1920-1927". [tradução, prefácio e notas de Renato Xavier]. Coleção Prêmio Nobel. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.

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