Ulisses, depois de livrar-se dos perigos mortais de Caríbdis, Χάρυβδις e Cila, Σκύλλα (/Skýlla/) viveu durante sete anos com Calipso. Quando esta lhe ofereceu a imortalidade, ele respondeu, thanks, but no thanks. Ulisses tinha aquilo que Homero chama, πολύτροπος (/polytropos/) «multiforme», «tentacular», próprio de quem «já deu muitas voltas» (do verbo, τρέπω/trépo/«girar»/«dar voltas») na vida e, por conseguinte, «já viu muito» e «percebe muita coisa».
Este polytropos, vê-se, não tanto por Ulisses conseguir ver o artíficio de Calipso, que não queria que ele partisse mas, sobretudo, por ter-se despojado de ύβρις (/hybris/), «soberba» frente à vida, esse enebriamento que engana os mortais fazendo-os crer que podem ser imortais, nem que seja por um instante.
O nome grego de ninfa Καλυψώ (/Kalypso/) deriva do verbo Καλύπτω (/kalypto/), «eu escondo», «eu embrulho». Se a ilha onde Ulisses passou sete anos com saudades de Ítaca -até que Atena o ouviu e se apiedou das suas lágrimas- é a mais difícil de localizar (será Gibraltar, será Gozo?), nessa «separação da vida» encontra-se o sentido da «eternidade.»
Eterno é um vocábulo derivado do latim, æternus, de um arcaico æviternus, que nos remete para ævum - «o que dura para sempre e sobre o qual nos é dado saber nada.» É um termo pan-românico.
Diz Dante, em Inferno, III, 2, -Per me si va ne l'etterno dolore (através de mim se chega à eterna dor)- que a «eternidade» que não é sinónimo de «beatitude, alegria, paraíso». A linguística também no-lo diz. A pretensão de viver aeternum é tóxica, como a proposta de Calipso feita a um mortal, soa a chantagem, comércio, pagamento.
Morte, é uma palavra de origem indo-europeia. Contra ela nada se pode a não ser aceitá-la. Proveniente de uma raíz mrti- designa o fim imposto pelas leis da natureza a todo o ser vivo. O termo universalizou-se, em termos linguísticos, apesar da diferença de significado entre as línguas neolatinas e germânicas.
Em francês, occitano e catalão, temos a forma mort, em espanhol, muerte, em português, como no italiano, morte. Todas designam a nossa condição de βροτοί (/brotói/), «mortais», pela nossa natureza diferente dos deuses.
No alemão e no inglês parece que linguisticamente não «fazem a ideia» da morte ser uma «necessidade da vida: da mesma raís indo-europeia, os termos mord e murder, que significam, «crime» e «assassinato».
A «eternidade » que a ninfa oferecia a Calipso em troca de viver para sempre escondido numa gruta não era um presente gratuito: «mortificar» é «matar antes de tempo», seja por maldade, inveja, rancor, ciúme - a um mortal.»
Somos livres até ao último dia, imperfeitos mas sempre aperfeiçoáveis - não estamos neste mundo para escravizar os nossos dias aterrorizados pela morte, «presos» à vida pelo medo e pela cautela, incapazes de liberdade.
(do livro, Etimologías Para Sobreviver Al Caos de Andrea Marcolongo, ed. taurus com adaptações])----------
Na língua grega Θανάτος, Thanatos, significa morte. Um termo muito diferente das línguas latinas e germânicas. Vem da mitologia grega e usa-se na ciência por razão dos termos científicos eruditos serem gregos e latinos.
Na mitolologia grega, Θανάτος, (/Thanatos/) era a personificação da morte e o irmão gémeo de ίπνος (/Hypnos/) o Sono. Os gregos antigos acabaram por usar o termo thanatos como uma palavra genérica para "morte". A «tanatologia» é um termo linguístico herdeiro directo do termo grego e foi documentado pela primeira vez em inglês em meados do século XIX. Como ciência, a «tanatologia» examina as atitudes perante a morte, o significado e os comportamentos de luto, a parte da medicina que lida com os problemas da morte e outros assuntos. Freud usou a palavra thanatos na sua teoria psicanalítica para descrever as nossas pulsões de auto-destruição.Κοιτάζοντας ένα άψυχο πτώμα, ποιος μπορεί να πει στον περαστικό, αν ήταν ο Ύλας ή ο Θερσίτης? (Olhando para um cadáver sem carne, quem pode dizer, transeunte, se era Hylas ou Thersites?) Epitáfio grego de mármore com relevo de um esqueleto. séc. II AD
(somos todos transeuntes nesta vida...)
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