Há normas absurdas nesta obsessão de manter todos os adolescentes dentro das escolas à força, mesmo que sejam violadores ou delinquentes, como se isso fosse a inclusão e o desejável que depois quando se juntam uma dezena de delinquentes sérios numa escola temos estas situações.
Ponte de Sor -sinto-me aterrorizado
Na Escola Secundária de Ponte de Sor, o fosso existente entre os membros da comunidade escolar parece não parar de crescer. Os estudantes sentem-se ameaçados, os professores impotentes, os encarregados de educação revoltados e a associação de pais critica a falta de comunicação com a direção.
Numa região de transição entre o Norte e o Sul, encontra-se Ponte de Sor. A cidade que está a aproximadamente 62 quilómetros de Portalegre, pertencendo ao distrito homónimo, já esteve nas bocas do mundo pelas mais variadas razões. No entanto, é o clima vivido na escola secundária do agrupamento que mais preocupa os encarregados de educação – que temem a frequência do estabelecimento por parte dos filhos, os alunos – que revelam não aprender nas condições ideais e os professores – que dizem ter medo de dar aulas. No entanto, o diretor do Agrupamento de Escolas de Ponte de Sor, Manuel Andrade, garante que a escola tem “problemas e dificuldades como todas as escolas têm”.
“Os professores perderam completamente a autoridade”
Jorge (nome fictício) é pai de Santiago (nome fictício), um adolescente de 17 anos, e assevera que quem destabiliza o ambiente da escola são “indivíduos que gritam, fazem aquilo que querem e os auxiliares de educação têm medo”. Segundo o encarregado de educação, estes alunos “estão habituados à impunidade” e tal leva a que “muitas coisas fiquem abafadas e não sejam comunicadas às autoridades”.
O progenitor avança que tem conhecimento de que os professores se queixam à direção e nada acontece, sendo que “perderam completamente a autoridade naquela escola”. A título de exemplo, um dos docentes já terá sido rodeado por um grupo de estudantes que queriam agredi-lo. Para Jorge, “a escola tem de ser um lugar seguro” e tal não se verifica na Escola Secundária de Ponte de Sor, onde “há alcoolismo e consumo de estupefacientes”. Mas, como “as escolas vivem de estatísticas e os professores até são obrigados a passar os alunos de ano”, as crianças e os jovens problemáticos continuam a ter os mesmos comportamentos.
Numa missiva de 23 páginas enviada ao i, Manuel Andrade, presidente do Agrupamento de Escolas de Ponte de Sor, começa por esclarecer que “no que diz respeito a estupefacientes é de referir que o Agrupamento tem procedimentos articulados com os elementos da Escola Segura”, adicionando que “neste domínio sempre que tal se justifica são interpelados alguns alunos e realizadas ações de sensibilização e dissuasão com a presença de brigadas da GNR com cães”, sendo que “até este momento não foi detetada a presença de nenhuma substância”.
Porém, confirma a existência de “influências e interações que se estabelecem à volta das escolas, onde circulam adolescentes”. Por outro lado, o tenente-coronel João Fonseca, chefe da divisão de comunicação e relações públicas da GNR, explicita que “relativamente a situações relacionadas com o tráfico de produtos estupefacientes e/ou posse de armas”, as secções de Prevenção Criminal e Policiamento Comunitário (SPC) e os militares do posto territorial de Ponte de Sor “têm incidido o seu policiamento junto à escola bem como nas suas imediações, principalmente nos horários dos intervalos letivos, tendo sido remetidas ao Ministério Público as denúncias referentes a este tipo de situações de que a Guarda tem conhecimento”.
“O facilitismo é o aspeto mais gritante. Aqueles que estudam e se portam bem olham para os pares que fazem o inverso e veem que não há consequências. Sentem-se desiludidos e desvalorizados, assim como indignados”, denuncia Jorge, que encara este panorama como “desgastante para os estudantes que se portam como deve ser”. “Estamos a criar pessoas irresponsáveis que, quando iniciarem a sua vida profissional, vão acabar por estar habituadas a ouvir ‘Sim’ a tudo e uma das grandes preocupações que tenho, enquanto pai, é que a palavra ‘Não’ deve ser ouvida”, confessa, rematando que “se calhar o Ministério da Educação não exerce o seu poder”.
“Há pessoas a entrar no mundo do crime enquanto deviam estar a estudar. A educação deve combater a escalada da criminalidade”, declara, admitindo que se sente extremamente assustado e desconfortável por saber “que os alunos andam com navalhas”.
Recorde-se que, a 18 de setembro de 2018, nesta mesma escola, um aluno, de 16 anos, foi esfaqueado por um colega, de 18. À época, o Comando Territorial de Portalegre da GNR elucidou que “o alerta foi dado cerca das 10h30 pouco depois de o aluno ter sido agredido com uma arma branca, uma faca, por um colega mais velho na zona da perna e da nádega”, sendo que a agressão ocorreu “no interior da escola, no decorrer de um intervalo”. A vítima foi assistida no local e depois transportada pelo INEM para o hospital de Abrantes, em Santarém.
“Relativamente ao uso de ‘navalhas’ durante este ano letivo, foi identificada uma aluna com a posse de um pequeno canivete. A escola, na presença desta situação, abriu o respetivo procedimento disciplinar tendo suspendido a aluna”, diz Manuel Andrade, informando que “no decurso do procedimento disciplinar apurou-se que a aluna tinha na sua posse esse objeto a pedido da própria mãe para que esta se defendesse do padrasto se tal fosse necessário”, acrescentando que “neste momento, esta aluna encontra-se institucionalizada numa instituição de acolhimento de crianças e jovens em risco” e assumindo que “para além deste caso não há referência a outros semelhantes”.
Todavia, não é este o panorama que dois professores descrevem ao i. O primeiro, Nuno (nome fictício), revela que “há alunos com uma navalha no bolso e mostram-na a quem quiser ver”, realçando que “quem controla o acesso às escolas tem medo” e “quem poderia fazer algo seria a GNR com uma rusga, mas não o faz”.
Para o docente que, tal como a maioria das fontes entrevistadas para a realização do artigo, não quer que a sua identidade seja revelada por medo de represálias, “os pais não têm o mínimo interesse nestas situações”, pois “são chamados às escolas e não fazem nada” e “uma das mães faz tráfico de droga, bebe, tudo aquilo que a CCPJ devia colmatar”.
“Já verifiquei que existem três ou quatro alunos com navalhas. Já tive alguns que me diziam quem assaltava casas e carros e como o faziam. Um deles foi apanhado em flagrante porque ia roubar a pistola de um GNR que estava dentro de um carro”, conta Pedro (nome fictício), outro docente.
O i contactou a Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CPCJ), que reencaminhou o pedido de contacto à CPCJ de Ponte de Sor. Contudo, até à data de fecho desta edição, o i não obteve qualquer resposta.
“Os pais e encarregados de educação devem ter um papel sensibilizador junto dos alunos para estas problemáticas”, assim como a Associação de Pais que “deveria sensibilizar os encarregados de educação para que estas situações se evitassem”, explica Manuel Andrade, adiantando que, a seu ver, “se algumas destas situações acontecem é porque algo na educação dos alunos falhou ou está a falhar antes da escola”.
Tentativa de violação de uma aluna
“Num dia em que faltei, disseram-me que um deles tentou violar uma rapariga. No primeiro dia, falou-se disso e depois, nunca mais se tocou no assunto”, lembra Santiago, filho de Jorge, enquanto Sara (nome fictício), também estudante da escola, frisa que “uns três rapazes começaram a apalpá-la, tinham os genitais de fora”. Os professores dizem ter ouvido rumores, mas não confirmam a concretização do alegado crime no interior da escola.
“Eu não faço a mínima ideia daquilo que está a acontecer, de nenhuma situação menos regular. As situações de violação e porte de armas estão reportadas à GNR, à CCPJ, à Câmara Municipal e ao Ministério Público. Segundo sei, está uma investigação em curso. Também estão a decorrer processos tutelares e disciplinares educativos”, afirma, por sua vez, Raquel Freitas, presidente da Associação de Pais e Encarregados de Educação do Agrupamento de Escolas de Ponte de Sor.
Confrontado com esta informação, Manuel Andrade declara que “é importante esclarecer que, depois de apurados os factos que estiveram na origem desta situação, conclui-se que o que estava em causa era uma suposta brincadeira entre um pequeno grupo de alunos que, no corredor da escola, se desafiam no sentido de saber quem era capaz de puxar as calças / fato de treino para baixo aos colegas”, sendo que “numa dessas situações foram puxadas as calças a uma aluna”, “não tendo havido nada mais do que esta situação”.
Ainda assim, deixa claro que a estudante em causa comunicou aquilo que aconteceu à direção da escola e foram tomadas “as devidas medidas”. “Reitero que foi apenas isto que aconteceu, não tendo resultado daqui nenhuma outra situação mais grave. Depois deste episódio que aconteceu em novembro, não temos conhecimento de mais nenhuma situação semelhante. Para além dos assistentes operacionais que estão permanentemente de serviço aos blocos onde decorrem as aulas, foi mobilizado um Assistente Operacional que circula no meio dos alunos enquanto está a decorrer o intervalo”, deslinda, opondo-se ao tenente-coronel João Fonseca que, ao i, expõe que “a Guarda Nacional Republicana confirma o registo de uma denúncia relativa a uma tentativa de violação a uma aluna da Escola Secundária de Ponte de Sor”, finalizando que “foram efetuadas as diligências policiais necessárias, tendo os factos sido remetidos para o Ministério Público”.
Mas os supostos crimes não ficam por aqui. De acordo com Santiago, alguns alunos mandavam mensagens à sua namorada e pediu-lhes que parassem. “Entretanto, não me disseram mais nada, mas se ela for sozinha para a escola, mandam bocas e assobiam”, lamenta, criticando também o facto de que, no início do ano letivo, uma rapariga terá sido “apalpada por um deles e pediu que parassem”, enquanto outra aluna terá sido agredida. “Se eu pudesse, sem qualquer dúvida, mudaria de escola”, evidencia.
“São tantas coisas que é difícil contar. As miúdas são apalpadas e violentadas nos corredores e ninguém faz nada. Há situações que, todos os dias, acabam por nos desgastar. A direção aconselha-nos a que aguentemos e isso parece-nos ridículo”, desabafa Mariana (nome fictício), encarregada de educação de Sara, jovem que partilha a crença de que “toda a gente tem medo”, na medida em que “é uma escola que tinha tudo para dar certo”, mas os estudantes sentem-se amedrontados por um grupo de alunos que dominam o sistema escolar. “Sou assediada constantemente. Não tenho muito como me defender. Quanto mais conversa damos, mais sarilhos há”, clarifica.
“A associação de pais devia ser um parceiro da escola”
Raquel Freitas não sabe se o clima de medo ainda está instaurado na escola, contudo, no início do ano letivo que está em vigor, o mesmo existia quer na instituição quer nas suas imediações. “A maioria dos pais reporta as situações à escola e não às entidades competentes. Houve um conselho de segurança, promovido pelo município, onde as várias entidades presentes apresentaram propostas de solução e sei que a Escola Segura tem uma presença mais habitual nas imediações”, aclara, indo ao encontro das declarações, neste âmbito, de Manuel Andrade e do porta-voz da GNR.
“Ao nível da escola, para além de processos disciplinares, não tenho conhecimento de mais nada. Quando a associação de pais coloca questões à direção do agrupamento obtém respostas. Há situações que me chegaram por portas travessas, porque os pais falam uns com os outros”, desvenda a dirigente, especificando que aqueles que serão jovens delinquentes “estão identificados, têm determinadas problemáticas, são seguidos, a maioria chega a processo tutelar educativo e a escola tenta tomar medidas”, mas existe um impedimento.
Quando a CCPJ tenta atuar, “as famílias não dão autorização para prosseguir e os casos vão para tribunal” e, “a partir daí, entra em segredo de justiça”. Na ótica da advogada de profissão, “as atitudes mais violentas alastram a outros alunos para além destes identificados pela escola” e, por esta e outras razões, “a associação de pais devia ser um parceiro da escola, uma ponte entre escola e encarregados de educação, mas não está a acontecer isso nem de uma parte nem de outra”.
“Entendo que estas matérias são sensíveis para serem usadas como arremesso ou como qualquer motivação política num ano que vai ser marcado por disputas ao nível das eleições autárquicas”, continua Manuel Andrade, aludindo à ligação do marido de Raquel Freitas ao PSD.
“Estas situações já foram apresentadas algumas vezes pela Senhora Presidente da Associação de pais, no entanto nunca foram apresentados nomes de pessoas envolvidas nestas situações. Qualquer entidade envolvida no processo educativo tem a responsabilidade de indicar de forma clara o nome das pessoas envolvidas nesses possíveis consumos ou tráficos”, sublinha o diretor para quem o ambiente da escola “globalmente é tranquilo, possibilitando que cumpra a missão educativa que tem prevista”, apesar de existirem “alguns problemas pontuais que surgem entre os alunos”.
Neste contexto, dá ênfase ao facto deste ser o único agrupamento de escolas da região e, por isso, receber alunos das mais variadas classes sociais e etnias, “todos os que aqui residem” e tal “pode significar que neste universo de cerca de 900 alunos possa haver alguns casos mais problemáticos para os quais são necessárias medidas adequadas e enquadradas nas nossas ações TEIP”, isto é, o Programa Territórios Educativos de Intervenção Prioritária.
De acordo com informação disponibilizada no site oficial da Direção-Geral da Educação, o programa anteriormente mencionado trata-se de “uma iniciativa governamental, implementada atualmente em 136 agrupamentos de escolas/escolas não agrupadas que se localizam em territórios economica e socialmente desfavorecidos, marcados pela pobreza e exclusão social, onde a violência, a indisciplina, o abandono e o insucesso escolar mais se manifestam” e, assim, são “objetivos centrais do programa a prevenção e redução do abandono escolar precoce e do absentismo, a redução da indisciplina e a promoção do sucesso educativo de todos os alunos”.
“No sentido de garantir as melhores condições para o funcionamento das atividades letivas nas escolas deste agrupamento”, segundo Manuel Andrade, terão sido contratados “os recursos que parecem mais adequados para dar resposta a estas solicitações”, ou seja, uma psicóloga, uma técnica de intervenção local, uma animadora sociocultural e uma educadora.
“Penso que a intervenção destas técnicas tem sido muito positiva no sentido de ajudar a resolver alguns problemas de aprendizagem e de comportamento de alguns alunos que se nos revelam mais problemáticos”, manifesta.
“A GNR é chamada e não faz nada”
Questionada pelo i acerca do panorama geral vivido na escola secundária, a GNR não esconde que “tem estado particularmente atenta à situação descrita, havendo alguns jovens devidamente referenciados por ações fora da escola que poderão interferir com a vida escolar, estando a Guarda sempre atenta e a dar resposta às ocorrências de que tem conhecimento relativas à escola”, destacando que “acresce informar que a GNR, no decorrer das ações de sensibilização realizadas pelos militares da SPC, em sala de aula, tem encontrado um ambiente de calma e respeito por parte dos alunos”.
João Fonseca explica que estas ações “visam não só a proatividade junto do estabelecimento de ensino, de forma a aproximar os militares e a comunidade escolar, como também assegurar a coordenação do cumprimento das diretivas e orientações relativas à prevenção criminal, policiamento de proximidade e segurança comunitária, em ações coordenadas de patrulhamento, fiscalização e sensibilização com as patrulhas realizadas pelo posto territorial, de forma flexível, e promovendo assim a visibilidade e segurança pública na área em apreço”.
Santiago e Sara têm uma perspetiva distinta. A cada dia, dizem deparar com “alunos que entram nas salas, andam por lá a dizer asneiras e voltam a sair”. A rapariga confidencia “que a direção devia fazer o seu trabalho, fazer com que estivéssemos seguros numa escola”, até porque “a GNR é chamada e não faz nada”.
“Já assisti a brigas em que os pais e alunos viram-se contra a GNR. Eles não respeitam ninguém. Nunca vejo o diretor da escola presente em nenhuma situação. Cada vez fica pior”, constata a adolescente que segue a mesma linha de pensamento de Santiago. “Estes alunos andam sempre em grupo, intimidam as pessoas, provocam e, se a pessoa responde, combinam entre eles e batem nessa pessoa. Eu tenho um amigo que levou porrada sem mais nem menos. Deram-lhe um murro, virou-se para trás e vieram mais pessoas”, exprime com a aflição patente na voz.
“Os professores têm muito medo, tanto que estes alunos entram nas salas, gritam, e só um ou outro os manda embora. E há um professor que foi chamado de anormal. Se alguém reage, não há ninguém que defenda essa pessoa”, descreve o rapaz.
O drama de quem (tenta) ensina(r)
Nuno dá aulas há vários anos e, ainda que considere que já enfrentou turmas complicadas, alega que este caso é mais perturbador do que os restantes. “Aquilo que eu tenho vindo a verificar é que seis, sete alunos são o terror dentro da escola e põem em causa toda a estabilidade que possa existir e provocam o terror de 900 pessoas. Nas minhas aulas, consigo controlar tudo porque não permito que as coisas tomem proporções graves, mas os comportamentos não são os melhores”, diz o profissional que expulsa das salas quem tem atitudes incorretas.
“Além de estarem sempre sem máscara, respondem mal aos professores e auxiliares, dão surras autênticas a outros alunos e o Conselho Executivo vai usando as ferramentas que tem para tentar resolver a situação”, lastima, transmitindo que em casos extremos, os alunos são suspensos, “mas não há sanções suficientemente fortes que sirvam de exemplo e, por isso, até já bateram num funcionário da CCPJ”.
Segundo o professor, os alunos podem ser colocados na rua e ser-lhes marcada falta disciplinar, sendo que tal é reportado ao diretor de turma que, por sua vez, transmite a informação “à direção se achar que é uma situação que merece essa intervenção”. Posteriormente, é instaurado um processo e, se a direção entender avançar com uma medida sancionatória, poderá ser de até 12 dias de suspensão e chegar ao extremo da proposta da mudança de escola. Porém, “este processo é muito moroso e difícil”, argumenta.
“Quando eles não estão na escola, nota-se uma diferença absolutamente extraordinária. Há certos colegas que perdem a vontade de dar aulas, assumem o seu desagrado e perdem a motivação. Não há volta a dar porque não há qualquer tipo de proteção. Nem que o professor faça o pino consegue que estes alunos se dediquem”, reconhece o docente, revelando que “os rufias são quase todos da mesma família – primos, irmãos, tios, tias, sobrinhos, sobrinhas – e estão todos à espera de fazer 18 anos para conseguirem sair da escola”.
Aliás, alguns deles relataram a Nuno “que não precisam de estudar porque vendem droga” e, no ano passado, uma professora terá sido “quase agredida fisicamente e o caso está em tribunal porque ela fez queixa e acabou por afastar-se do ensino”, declara, compreendendo que a colega não tenha suportado a pressão.
“Os técnicos da CPCJ que podem tomar alguma ação residem aqui e toda a gente sabe onde mora toda a gente nestas aldeias grandes que não são cidades. Em termos de estrutura escolar, a mesma coisa. Portanto, as pessoas tentam passar pelo intervalo dos pingos da chuva para tentarem fazer tudo da mesma forma”, começa por concluir. “Sinto-me aterrorizado. Temos dois mundos dentro de uma escola”, termina.
“Tive conhecimento de uma situação de um aluno que se recusou a vir para a escola, antes do segundo confinamento, por causa da covid-19. Então, os professores tinham de preparar materiais específicos para lhe enviar para que ele não perdesse as matérias. O aluno não quer saber da escola” e, num dos dias do período de isolamento, o rapaz terá ido à escola espancar um colega numa das casas de banho “e saiu como se nada fosse”.
“Não vou dizer que, quando há situações mais de confronto, estou completamente tranquilo. Numa manhã, fui dar aulas e havia um bloco que parecia um manicómio. Estava uma porta trancada e um miúdo bateu nela até se abrir para encontrar outro que lhe tinha feito algo. Está muito difícil”, relata o professor Pedro que acredita “que os confinamentos tenham agravado esta falta de formação de base porque é isso mesmo que falta”, sendo que “certamente que, em casa, com os pais, ainda faziam pior”.
Para combater esta realidade, o docente continua a dar o seu melhor, mas nem isso demove estes alunos. “Não lhes estamos a ensinar nada, é impossível fazê-lo. Tentam replicar os exemplos que têm em casa”, alerta, indicando que, no final do primeiro período deste ano letivo, havia brigas todos os dias. “Há disciplinas em que existem dois professores a dar aula porque há receio de se dar aulas sozinho. Temos de fazer algo para melhorar a nossa realidade porque, qualquer dia, não há professores. Somos autênticos fantoches que andam ali”, avisa.
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