O principal é que a justiça nos representa, age em nosso nome e não em nome próprio e um juiz tem que ter isso presente quando julga. Tem de perguntar a si mesmo se está, de facto, a contribuir para a justiça e a representar bem o povo que serve. Ora o povo não tem maneira de fazer-se ouvir junto deste orgão de soberania a não ser manifestando-se, pois os juizes não são eleitos. Uma petição vale o que vale, pois não é um processo em tribunal que tem outra seriedade, é uma maneira das pessoas mostrarem aos juizes e ao poder político, grande responsável pela promiscuidade entre a política e a justiça, o que pensam sobre a maneira como estão a ser representados. Podiam ter escrito uma carta aberta, por exemplo. Decidiram fazer uma petição. Estão no seu direito e fazem bem, porque o povo não pode ser uma entidade abstracta que só existe na hora do voto.
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A consagração constitucional da inamovibilidade dos juízes justifica-se em virtude de um triste episódio ocorrido em Portugal. Logo a seguir à implantação da República, o ministro da Justiça do Governo Republicano, Afonso Costa, decidiu processar no Tribunal da Relação de Lisboa o antigo primeiro-ministro João Franco por violação da Carta Constitucional da Monarquia. Os juízes desembargadores da Relação de Lisboa acharam o processo absurdo, na medida em que, tendo o acusador violado ele próprio a Carta Constitucional da Monarquia, já que tinha derrubado o regime monárquico, não fazia qualquer sentido vir depois mover um processo a um antigo governante por desrespeitar essa mesma Carta Constitucional. Por isso recusaram-se a julgar procedentes essas acusações contra João Franco. Indignado com essa decisão, Afonso Costa determinou, através do Decreto de 21 de Dezembro de 2010, que os quatro desembargadores da Relação de Lisboa que a tomaram fossem compulsivamente transferidos para a Relação de Goa, a mais de 8.000 km de distância.
É por isso inaceitável o surgimento no Portugal de 2021 de petições a solicitar o afastamento de um juiz por causa das decisões que tomou num processo. Tal é, no entanto, um sintoma de uma séria desconfiança dos cidadãos no sistema judicial, que torna absolutamente necessária uma reforma profunda do mesmo.
Luis Menezes Leitão
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