February 09, 2021

Devo ser de outro planeta porque estes artigos irritam-me - qual luz?



Todos nascemos, mas nem todos sabemos como: estas imagens mostram a dor e a luz de cada parto

Já são conhecidas as melhores imagens de 2021 do concurso de fotografia promovido pela International Association of Professional Birth Photographers. 

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E tenho a certeza  que isto que escrevi vai chocar muita gente.

Irritam-me estes artigos onde se fala do parto como uma coisa encantadora e se põem montes de fotografias do sofrimento como se fosse uma coisa fantástica e feérica. 

Porque é que se confunde os filhos com o parto? Lá por ser preciso o parto para ter filhos, não significa que as duas coisas tenham o mesmo significado. Achamos um filho maravilhoso mas o parto é aquilo que é: um procedimento complexo, perigoso, violento, de limite e de sofrimento físico e psíquico para a mulher, no fim de um processo de meses de violência sobre um corpo. 


- no último mês de gravidez, todos os orgãos estão fora do sítio, a pressão nos rins e na coluna é enorme, nos nervos motores e nem falo nas complicações de troca de ADN entre mãe e filho. Um filho é uma coisa maravilhosa mas todo o processo de o ter é uma violência que se faz à pessoa. Todos nós fomos uma violência para as nossas mães, apesar de ser uma coisa natural, mesmo para aquelas mulheres que adoram estar grávidas, que as há. Mesmo essas não gostam de partos. Nunca ouvi uma mulher dizer que gostou do parto e imensas contam histórias terríveis de sofrimento. 


Se perguntam: mas os filhos fazem o parto valer a pena? É claro que o nascimento de um filho atenua tudo o resto e uma pessoa até se 'esquece' quando vê o filho. Mas na verdade não esquece, nem é doida de achar que aquilo é uma experiência como outra qualquer. 

E quando se diz que a maioria das gravidezes, hoje em dia, acabam bem e sem grandes problemas (há acompanhamento médico e as crianças nascem em ambientes hospitalares) é porque se desvaloriza a experiência das mulheres. Gravidez sem problemas, significa, nessas estatísticas: ninguém morreu, ninguém ficou deficiente. Tudo o resto que afectou física e psicologicamente as mulheres, nem é tido em conta, pelo facto de se assumir que é tudo minudências. Mas a gravidez e o parto são processos muito complexos que alteram por completo a pessoa.

Encantadores são os filhos mas não a gravidez (para algumas mulheres no início e para quase todas no nos últimos meses) e muito menos o parto. E digo isto sem ter tido uma má experiência. Felizmente. Mas não compreendo que ponham em cima das mulheres este estigma de terem que achar que o sofrimento porque passam é maravilhoso. 

O facto do parto ser uma coisa natural não a torna maravilhosa. Montes de coisas naturais não são maravilhosas. A menstruação não é uma coisa maravilhosa, pelo contrário. Tenho alunas que todos os meses ficam de cama cheias de dores, vomitam... é uma coisa horrível. E eu falo sem nunca ter tido grandes problemas. Hoje em dia há pílulas que suprimem o período, o que é óptimo e se eu fosse mais nova nem hesitava. Oh, meu deus, não ter que passar por isso... Chegará o dia em que as mulheres não terão que fazer a gestação dos filhos no útero ou só farão uma pequena parte e muito menos sofrer os partos. 

É tudo uma enorme violência. A gravidez é uma violência que transforma o corpo interiormente: os orgãos saem todos do lugar, andam esmagados durante meses, uma pessoa não consegue dormir, as hormonas todas desreguladas, fica-se psicologicamente afectada, não se consegue fazer as coisas mais simples... e outras coisas que imensas mulheres têm, como dores tremendas, problemas nos rins, nas articulações, flebites, desvios de coluna, perder dentes e mil e uma complicações. E muitos destes problemas deixam sequelas para o resto da vida. Sim, há isso de sentirmos um filho dentro de nós, que é maravilhoso, mas tudo o resto é tão existencialmentne estranho, perturbador da vida e violento...

E o parto é uma violência: dores e sangue por todo o lado e a sensação que os orgãos do corpo estão a ser puxados e vão-se embora também. Isso é horrível. Parece um cenário de guerra. E não acaba com o nascimento da criança... aquilo continua. Mais dores e tudo outra vez até que saia a placenta, e depois são semanas a recuperar. Não me venham dizer que isto é maravilhoso. 

Fazem estes artigos cheios de fotografias a glorificar o sofrimento... isto é coisa das religiões e dos sedimentos que deixam nas sociedades, isto de quererem convencer as mulheres que o sofrimento é lindo. Lindo, o tanas. A natureza não é perfeita e linda como dizem as religiões que meteram um homem numa cruz e glorificam o seu sofrimento e querem que todos passemos por ele. A natureza e muitos dos seus processos são necessários, mas terríveis. 

Quem é a louca que podendo não passar por isso do parto, escolhia passar? É tão violento que mesmo nos dias de hoje, com a medicina como está, ainda se morre de parto. Morre-se! É uma experiência-limite e muito perturbadora. Como é que uma coisa assim pode ser maravilhosa? 

Irritam-me estes artigos que pervertem os processos e põe nas mulheres uma pressão sem sentido de abraçarem o sofrimento. 


7 comments:

  1. Olha, eu fiz uma cesariana porque a minha filha não deu a volta. Como a tive no privado, fui fazê-la com dia e hora marcados. Não tive uma única dor e ainda bem!

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  2. Discurso típico de determinadas classes sociais. Discurso horroroso, muito próximo de determinado pensamento que se pensava que a modernidade iria erradicar. Pelo contrário, acentuou-o e aí está ele em todo o seu esplendor.

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    1. Ok.. falou com slogans: o discurso é horroroso porque é de determinadas classes sociais... isso é dizer nada.
      A modernidade ia acabar com os discursos que acha horrorosos... okay... lol é o que chama falar e não dizer nada.

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    2. Não, o discurso é horroroso pelo conteúdo, não pela classe social em si. Ele reflete, sim, uma determinada postura, característica de determinadas classes sociais.

      A modernidade, supostamente, iria superar determinados pensamentos, certas formas de eugenia.

      Até esse LOL é característico de uma gíria classista. De modo semelhante, a sua referência ao país não urbano como «província» é reflexo de uma visão de «outros tempos».

      Espero ter dito «algo».

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    3. Pois, não diz nada, não... que o meu discurso é horroroso, em sua opinião. Ok, já tinha dito, não sabemos é porquê... se calhar gosta de mulheres a sofrer durante o parto... pois, olhe, sofra à vontade... cada um é como cada qual, como se costuma dizer.

      Pertenço a uma classe social porque prefiro não sofrer... e isso é um pecado, pelos vistos... ok LOL (outra vez)

      - o termo eugenia aplicado ao que eu disse é só ridículo ou então não sabe o que isso quer dizer.

      - Portanto, vai dizendo opiniões sem justificação, é só mesmo dizer mal. ok, esteja à vontade. LOL (um aparte: tenho amigos de todas as classes sociais a dizer lol)

      Já agora, porque pelos vistos não percebeu, uso o termo província, de propósito para evocar outra época - tenho esse hábito de usar as palavras de modo intencional e significante.

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  3. Por este andar, ainda vamos ver aqui gente a glrificar a extração de dentes sem anestesia...para estarmos mais perto da modernidade. Mas, afinal, a modernidade não era suposto trazer-nos bem estar em vez de sofrimento?!
    Não percebo estas opiniões! E o que tem de mal usar o LOL?! Também não percebo!
    Porque motivo há sempre gente a embirrar com tudo? Será do confinamento?!

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  4. não sei... pessoas que em vez de argumentar chamam nomes e fazem processos de intenção injustificados importam-me pouco.

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