O Preço do Segredo
Miguel Poiares Maduro
Em outubro subscrevi, com outros académicos europeus, um artigo criticando o Conselho da União Europeia por ter alterado a seleção para a procuradores europeus no caso dos nacionais de três países (um dos quais Portugal), cedendo à preferência dos respetivos governos nacionais em vez de manter a escolha feita por um comité independente europeu.
Admitíamos que esta escolha não era vinculativa, mas entendíamos que o Conselho só a deveria alterar apresentando razões importantes, claras e assentes num processo transparente. Não foi o que aconteceu, criando uma suspeição sobre a integridade do processo e possíveis interferências governamentais.
O que descobrimos nos últimos dias, sobre o caso português, dá razão às nossas preocupações. Alguns jornalistas divulgaram a carta ao Conselho com que o Governo português defendeu a alteração da escolha que tinha sido feita pelo comité independente. Desta constam informações erradas (para usar a expressão do Governo quando confrontado com o documento). Ao assentar em informação incorreta, a decisão do Conselho ficou naturalmente viciada. Mas é agora, por razões práticas e processuais, praticamente impossível ao Conselho corrigir esse vício.
Há pelo menos uma lição que podemos tirar a nível europeu e um juízo político a fazer a nível nacional. Para a União Europeia, este caso reforça a necessidade de aumentar a transparência no âmbito das decisões do Conselho. Não fosse ter existido uma fuga de informação quanto ao teor da carta do Governo português e ainda hoje não saberíamos que a decisão do Conselho tinha assentado em pressupostos errados. Isto expõe os riscos a que a falta de transparência expõe o processo de decisão europeu. Os governos podem enviar, de boa ou má-fé, informação nacional incorreta, falsa ou, mesmo, manipulada. Sem o escrutínio público decorrente da transparência, os outros governos e as próprias instituições europeias dificilmente estarão em condições de detetar esses erros. Quantas outras decisões europeias podem estar a assentar em informação incorreta enviada pelos governos nacionais e que não é publica? Quanto a Portugal, há duas questões distintas. Vamos presumir, quanto à primeira, a boa-fé invocada pelo Governo quanto aos erros constantes na carta enviada ao Conselho e que a ministra não deve sequer ser considerada responsável por não os ter detetado (apesar de até ser magistrada do Ministério Público). O que não me parece de todo justificável é a tentativa de esconder estes erros não permitindo a divulgação da carta e procurando inicialmente negar que eles existissem. Esta tentativa de encobrir o erro é objetivamente grave. Coloca em causa os mecanismos de escrutínio e responsabilização que são próprios da democracia.
Em outubro subscrevi, com outros académicos europeus, um artigo criticando o Conselho da União Europeia por ter alterado a seleção para a procuradores europeus no caso dos nacionais de três países (um dos quais Portugal), cedendo à preferência dos respetivos governos nacionais em vez de manter a escolha feita por um comité independente europeu.
Admitíamos que esta escolha não era vinculativa, mas entendíamos que o Conselho só a deveria alterar apresentando razões importantes, claras e assentes num processo transparente. Não foi o que aconteceu, criando uma suspeição sobre a integridade do processo e possíveis interferências governamentais.
O que descobrimos nos últimos dias, sobre o caso português, dá razão às nossas preocupações. Alguns jornalistas divulgaram a carta ao Conselho com que o Governo português defendeu a alteração da escolha que tinha sido feita pelo comité independente. Desta constam informações erradas (para usar a expressão do Governo quando confrontado com o documento). Ao assentar em informação incorreta, a decisão do Conselho ficou naturalmente viciada. Mas é agora, por razões práticas e processuais, praticamente impossível ao Conselho corrigir esse vício.
Há pelo menos uma lição que podemos tirar a nível europeu e um juízo político a fazer a nível nacional. Para a União Europeia, este caso reforça a necessidade de aumentar a transparência no âmbito das decisões do Conselho. Não fosse ter existido uma fuga de informação quanto ao teor da carta do Governo português e ainda hoje não saberíamos que a decisão do Conselho tinha assentado em pressupostos errados. Isto expõe os riscos a que a falta de transparência expõe o processo de decisão europeu. Os governos podem enviar, de boa ou má-fé, informação nacional incorreta, falsa ou, mesmo, manipulada. Sem o escrutínio público decorrente da transparência, os outros governos e as próprias instituições europeias dificilmente estarão em condições de detetar esses erros. Quantas outras decisões europeias podem estar a assentar em informação incorreta enviada pelos governos nacionais e que não é publica? Quanto a Portugal, há duas questões distintas. Vamos presumir, quanto à primeira, a boa-fé invocada pelo Governo quanto aos erros constantes na carta enviada ao Conselho e que a ministra não deve sequer ser considerada responsável por não os ter detetado (apesar de até ser magistrada do Ministério Público). O que não me parece de todo justificável é a tentativa de esconder estes erros não permitindo a divulgação da carta e procurando inicialmente negar que eles existissem. Esta tentativa de encobrir o erro é objetivamente grave. Coloca em causa os mecanismos de escrutínio e responsabilização que são próprios da democracia.
No comments:
Post a Comment