Esta é uma questão interessante. Saber viver não é igual para todos, porque saber viver tem que ver com o que se deseja da vida, o que se valoriza e as pessoas querem e valorizam coisas diferentes da vida e, por isso, dão significados diferentes às palavras que marcam o saber viver: o sucesso, a realização, o poder, o reconhecimento, etc.
Sabe viver tem a ver com aceitar o tipo de pessoa que somos, no que não tem mudança e mudar aquilo que podemos mudar para a tornar melhor, caso contrário toda a vida é um sofrimento sem sentido, um desperdício de tempo e esforço. Eu, por exemplo, sou anormal... durante a adolescência queria muito ser normal, mas isso nunca aconteceu. Assim que abria a boca deitava tudo a perder (tenho uma fotografia dos meus vinte e poucos anos, em que apareço sentada à mesa, já no fim de um almoço a discutir contra 6 indivíduos - estão eles todos de um lado e eu do outro, a fotografia é cómica) e às vezes nem era preciso abrir a boca porque também a minha maneira de olhar dava origem a queixas de arrogância.
Chamam-me arrogante e às vezes perguntam-me quem é que penso que sou... eu penso que sou um ser humano, que não estou acima de ninguém, mas também não estou abaixo de ninguém e não me rebaixo, nem aceito que me rebaixem. Outro dia quando fui à junta médica achei estranho que várias pessoas que entraram antes de mim tivessem entrado a chorar ou choramingar e pensei, na minha ingenuidade, que deviam estar muito doentes. Isso foi até conhecer o par de burocratas que me atendeu... é isso, não sei rastejar e agora já é tarde para aprender. Nem queria. Acho que não tenho que rastejar para me tratarem como um ser humano.
Mas pronto, isto para dizer que uma pessoa tem que aceitar aquilo de si que não muda e vê-lo de um ponto de vista positivo, mesmo sabendo que é uma fonte de problemas. Depois é preciso saber o que se valoriza na vida pois saber viver é saber encontrar isso que se valoriza.
Eu valorizo a paz e as pessoas. Quero paz, paz interior em primeiro lugar, para o que é necessário estar de bem com a consciência, mesmo que isso implique muito problemas de ter que lutar e falar e intervir, quando só quero estar calada. Depois valorizo as pessoas. Não todas, a não ser em abstracto. Interessam-se as pessoas. Valorizo tanto que sou um bocado ingénua na relação com as pessoas, até certo ponto. E é de propósito. Valorizo a família e os amigos, claro, mas também fazer algo pelos outros. Faço isso na minha profissão. Tento ajudar e trabalhar para uma sociedade mais humana e justa. Tenho uma atitude em relação ao mundo parecida com a que ouvi um actor dizer relativamente à sua participação nos filmes do 007, quando lhe perguntaram que conselhos dava ao próximo actor a encarnar a personagem: não a estrague e deixe-a em melhor estado do que a encontrou. É isso.
Não quer dizer que não valorize o dinheiro, por exemplo. Claro que valorizo porque permite uma vida digna. Gostava que me pagassem um salário justo e adequado à qualidade do trabalho que faço e, porque a cultura é cara e eu gosto de ir a um concerto, comprar livros, ir a um museu, visitar outro país, etc., e para isso é preciso ter algum dinheiro - para não falar na saúde, naturalmente. Esta doença que tenho, desde que comecei o diagnóstico, em Abril de 2018, até hoje, já custou 200 mil euros... não é pouca coisa. No entanto, não valorizo o dinheiro em si mesmo e nunca escolheria uma profissão, como vejo tantos alunos fazerem, com o intuito de ganhar muito dinheiro. Nem trocava a minha paz de espírito e a minha consciência por benefícios materiais.
Portanto, a boa vida, o saber viver, tem muito que ver com o que se valoriza e não é igual para todos. Como valorizo a paz, saber viver é encontrar um equilíbrio entre o que devo seguir e não seguir que me permita alcançar paz. E como valorizo as pessoas, tento valorizá-las. E como valorizo a minha consciência, não rastejo, mas também não prejudico os outros. E como valorizo o mundo que deixo para o meu filho e os que vieram a seguir, é fazer algo pelos outros, nem que seja andar aqui no blog a criticar tudo o que me parece mal.
E isto também é um balanço do género das listas.
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