“Often, towards nightfall, there’s a feeling in the air of mystery, threat, frustration – all of these at once. I would like my painting to have the quality of such moments.” (the artist cited in David Anfam, Mark Rothko: The Works on Canvas: Catalogue Raisonné, New Haven and London, 1998, p. 88),
“Pictures must be miraculous: the instant one is completed, the intimacy between the creation and the creator is ended. He is an outsider. The picture must be for him, as for anyone experiencing it later, a revelation, an unexpected and unprecedented resolution of an eternally familiar need.”
Mark Rothko, "The Romantics were Prompted…,” Possibilities, New York, No. 1, Winter 1947-48, p. 84
Rothko foi um pintor americano expressionista abstracto. O Expressionismo abstracto que vem dos anos 40 e 50 do século XX quer fazer arte que seja ao mesmo tempo abstracta e emocional, expressiva. Foram influenciados pelo surrealismo, pela ideia de que a arte deve vir do inconsciente e também pelo automatismo de Miró: a ideia de que a mão do artista, mais do que afirmativa, deve ser veículo das forças inconscientes. Entre os expressionistas abstractos há os que atacam as telas como Pollock e de Kooning e os que as enchem de uma única cor como Barnett Newman, Clyfford Still e Rothko. Foi Rothko quem, com o seu sucesso, chamou a atenção para o expressioniso abstracto que antes dele era um nicho da arte pouco conhecido. Rothko é influenciado por outros: vemos algo de Turner nas suas obras, bem como da luminosidade de alguns impressionistas e o uso táctil da cor de Giotto - a capacidade de usar a cor para gerar atmosferas. E há algo dos românticos nas suas obras: a arte como um escape contemplativo e meditativo do mundo.
Estes pintores estavam profundamente interessados no mito e criaram composições simples com grandes áreas de cores destinadas a produzir uma resposta contemplativa ou meditativa no espectador. São telas sobre o drama humano de ser.
It would be good if little places could be set up all over the country, like a little chapel where the traveler, or wanderer could come for an hour to meditate on a single painting hung in a small room, and by itself.” (the artist cited in Exh. Cat., Riehen/Basel, Fondation Beyeler, Mark Rothko: A Consummated Experience Between Picture and Onlooker, 2001, p. 22)
Mais do que criar arranjos de formas e cores queriam expressar emoções humanas profundas. Rothko pintava muitas vezes atormentado pelas suas emoções. Gostava de supervisionar a disposição das suas telas expostas e queria que ocupassem, sozinhas, de preferência mais do que uma, lado a lado, uma sala inteira. A ideia era pôr o espectador numa situação imersiva, como se diz hoje, completamente mergulhado em si mesmo a partir das telas, sem distrações que o desviassem desse, 'mergulhar em si'.
“I paint very large pictures…precisely because I want to be very intimate and human. To paint a small picture is to place yourself outside your experience…However you paint the larger picture, you are in it. It isn’t something you command.” (Exh. Cat., London, Tate Gallery, Op. Cit., p. 85)
As telas de Rothko distinguem-se de todas as outras -pelo menos é assim que as vejo, sinto e penso- pela textura emocional e profundidade plástica. Por exemplo, esta pintura neste tom é tão brilhante que quase se ouve, tem uma textura sonora e depois, as linhas de ruptura e manchas criam camadas de profundidade plástica. O que quero dizer é que a pintura dele convoca as nossas emoções (que têm cores consoante são mais pesadas, vibrantes, afirmativas, depressivas, leves, etc.) como faz a música que tem essa capacidade de fazer bypass da razão e ir directamente à emoção e ao inconsciente e desassossegá-los. Faz isso ao mesmo tempo que se adapta à profundidade de cada um e é a isso que chamo profundidade plástica: pessoas com profundidades, dramas e experiências diferentes vão dentro da tela até onde podem e a pintura aceita-as a todas, se é que me faço entender.
A apreciação de uma obra destas de Rothko, mais do que outras figurativas, tem de fazer-se em presença se queremos ser afectados pelo seu poder metamorfoseador. É o mesmo que vermos na internet uma fotografia do pico de uma montanha ou a beira de um precipício. Sim, ficamos com uma ideia da grandiosidade, até majestade, do pico e do perigo do precipício, mas a sensação de esmagamento diante do pico ou de excitação e medo perante o precipício, essa emoções que ficam em nós e nos movimentam o arranjo interno, só mesmo estando lá em frente deles. Com estas telas é a mesma coisa (uma das minhas viagens de sonho era fazer um roteiro tendo como pontos de paragem, algumas obras de arte, que queria muito ver ou rever, entre elas muitas de Rothko)
As obras de Rothko são das que mais têm um poder terapêutico e pedagógico - um guia que ajuda a fazer viagens dentro dos nosso próprios picos e precipícios e a sair de lá, não só intactos mas com a força criativa que a visão desses sítios de difícil acesso proporcionam, longe da placidez das superfícies planas.
Rothko era um leitor convicto de Nietzsche.
De onde nasce o instinto para a expressão artística em geral, do artista e do ser humano comum? Ou já nasce de algum modo com a pessoa, essa visão diferente de percepcionar a realidade, como acontece com os artistas, ou nasce associada a um acontecimento emocional forte, como o amor, por exemplo, que altera, expande, a percepção da realidade e põe as pessoas a escrever poesia. Portanto, é da revelação de certas regiões internas que não eram exploradas que nasce o impulso criador e a possibilidade de plenitude. A vida rica, criativa e livre implica uma pedagogia do 'eu'. Tal como a vida, as obras de Rothko precisam do investimento do humano nelas.
“There is a need for a whole world of torment in order for the individual to sit quietly in his rocking row-boat in mid-sea, absorbed in contemplation.” (Friedrich Nietzsche, The Birth of Tragedy, translation by Francis Golffing, New York, 1956, pp. 33-34)
Esta pintura, hoje, faz-me pensar nos horizontes de possibilidades da existência. Como tudo recomeça. O amarelo brilhante como o sol é quente e esse calor enche a tela toda até às bordas e transborda para dentro de mim. Há um fluir de cor e de luz, uma atmosfera etérea, neste infinita, mas densa -nas zonas superiores onde sombras sublinham- explosão de luz. Há uma linha vermelha de vida mas muito ténue, quase rosada que não perturba dramaticamente esta sensação de plenitude de expansão do 'eu' e de exaltação da vida. E depois em baixo, o amarelo é um mar de calma com zonas de profundidade. Uma tela optimista e cheia de força vital.
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