Uma pessoa tem uma vida muito activa e culturalmente interessante, sai com muita regularidade, vê amigos e etc..., e de repente fica 9 meses encerrada em casa. Sai sobretudo para ir a hospitais e médicos. Sendo por natureza uma pessoa que, já normalmente, absorve e processa quantidades absurdas de informação e passa muito tempo a rearranjar o esquema interno, numa situação destas, passa a encaixar ainda mais informação e a remoer mais e muito nas mesmas coisas, ainda para mais se tem imaginação. Agora, passo muito tempo sozinha. Não é que me incomode estar sozinha, mas não nesta situação de isolamento forçado. Acaba-se por perder um bocadinho a perspectiva das coisas e a ter até alguma distorção da realidade. De modo que uma coisa importante é lembrar os factos e os princípios que os enformam, porque eles, se bem que não dizem tudo, falam. Outra é não tomar decisões importantes e que comportam riscos numa altura destas e mais ainda sem comunicação séria.
Uma pessoa nesta pandemia, cortada de repente da sua vida normal e isolada, corre o risco de desequilibrar a visão de si e do mundo. Eu sei que ando com os nervos à flor da pele, também porque estou quase em cima da data de fazer um exame para saber da progressão da doença e, embora a minha cabeça pareça não estar aí, o corpo sabe muito mais do que eu e já está a variar os níveis de cortisol. Depois a porcaria da úlcera no olho há um mês e meio não ajuda à calma. E outras coisas. Mas a minha cabeça é forte. Isso eu sei. Pode ser disparatada, às vezes, mas é forte. Já me salvou a vida, literalmente, umas 3 ou 4 vezes. E a minha intuição funciona bastante bem, também já me salvou, eu é que nem sempre lhe dou ouvidos.
Quando tinha que tomar decisões acerca de seguir tratamentos oncológicos, falava com duas ou três pessoas em quem confiava muito e depois fazia uma lista, baseada na informação que tinha acerca do tratamento e efeitos secundários, dos factos que diziam, 'sim' e dos que diziam, 'não'. E depois decidia. Decidi sempre com coragem, mas também com inteligência, penso, embora, como tenho mais coragem que inteligência, houve uma altura que um amigo teve que me chamar parva para eu perceber que ia entrar pelo caminho errado.
É isso. Pôr as coisas em perspectiva. Pensar e decidir. Ou melhor, repensar porque já tinha pensado e decidido mas às vezes os factores externos modificam-se e somos obrigados a reconsiderar e reordenar. Enfim, depois de pensar seguir a 2ª e a 3ª regras da moral provisória de Descartes. A filosofia é minha amiga, também já me salvou a vida 🙂 Fazer isto sem nenhum pensamento de má-fé ou maldade que abomino e de qualquer maneira não seria capaz porque não é isso que tenho no coração. Isto não tem que ver com jogos de perder e ganhar, tem que ver com a possibilidade de vida.
Não é como se me faltasse tempo para pensar, aqui fechada... ... enfim, vou fazer uma omelete de cogumelos, que agora o que tenho é fome 🙂
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