September 09, 2020

O absurdo dos horários das escolas



Se calhar a maioria das pessoas não sabe mas um dos poderes feudais das direcções das escolas está na manipulação dos horários dos professores. Qualquer professor quer saber o mais cedo possível o seu horário para organizar a sua vida: é diferente ter aulas sobretudo de manhã ou sobretudo à tarde ou tudo misturado. As pessoas têm uma vida fora da escola, têm família, têm filhos, muito professores, sobretudo os contratados, vêm de longe, às vezes de muito longe e uma pessoa precisa de organizar-se. 

É importante saber as turmas que se tem, os níveis -os anos de escolaridade - é diferente dar aulas só a turmas do 10º ou dar a 9ºs e 10ºs ou 7ºs, 8ºs, e 9ºs... houve um ano que tive quatro níveis o que significa que tinha de preparar 4 programas diferentes, material diferente para cada turma, etc. Não me importo, acho piada, embora seja extremamente cansativo, mas há professores que mesmo com dois níveis diferentes já se desorientam. 

Seja como for, uma pessoa se quer estar preparada para começar bem as aulas tem que saber com o que vai trabalhar (turmas de ciências são diferentes de artes ou de humanidades) e em que horário. 

Geralmente há uma reunião no fim do ano em que se distribuem as turmas e os níveis, mas as direcções podem mudar os horários e mudam muitas vezes. Os horários costumam ser feitos em Julho e Agosto. Este ano terá sido mais tarde devido à teimosia de fazer exames de fantochada.

A questão é que as escolas escondem os horários. É claro que os amigos especiais, sabem logo os horários,  que são sempre especiais -já dei aulas numa escola, há muitos anos, em que duas amigas especiais pediam um furo de duas aulas a meio da manhã para irem às compras- mas a maioria das pessoas está quase até à véspera da 1ª aula sem saber o seu horário de trabalho. 

Pode pensar-se que isto é ridículo, se não se souber que o horário é uma das maiores armas de ameaça das direcções, porque é evidente que um horário todo esburacado dá cabo da vida a uma pessoa. Passa o dia na escola e à noite vai fazer o trabalho que se faz fora da escola. Sobretudo no secundário que dá muito trabalho. Ou um horário com 6 turmas ou 8 turmas. Já tive 8 turmas. Era muitíssimo mais nova, foi nos primeiros anos de dar aulas, mas foi um ano horrível, não conhecia as turmas da tarde, não reconhecia os alunos..., estava sempre morta de cansaço. Nesse ano tive oito turmas porque a delegada do grupo pediu para ter duas turmas e enfiaram-me tudo quando era turma porque era a mais nova. Estas coisas, sempre as vi acontecerem nas escolas mas pioraram muito.

 Há professores que têm sempre um horário especial só com uma turma ou duas e projectos de fazer nada (ou até de estragar alunos) enquanto outros são carregados de 6 ou 7 turmas mais aulas de apoio, ou DTs sem horas lectivas que vão directas para projectos de amigos. Isto é comum nas escolas. O que se passa ao nível macro, dos governos, passa-se ao nível micro, das escolas, com a agravante que, em relação aos governos ainda vai havendo uma oposição e alguns jornalistas que denunciam, mas nas escolas... nada. Ninguém se atreve a falar para não ser alvo de vinganças. Têm medo de algumas pessoas porque vêem o que elas fazem a outras. É um clima malsão muito anti-pedagógico. Dantes não era assim, havia outro modelo de gestão nas escolas. Não eram feudais.

A maioria das escolas esconde os horários. Apesar de serem públicos, só alguns professores têm acesso aos horários de todos os colegas, para que não se veja, ano após ano, os favores que fazem sempre aos amigos especiais, por razão de....nada, serem amigos... 

Há escolas onde o horário é dado pelo delegado do grupo em envelope fechado a cada professor, como se fosse um testamento. Há escolas onde o director faz uma reunião geral de professores com um discurso interminável no fim do qual, com grande pomposidade manda distribuir os horários. Há escolas que obrigam o professor a assinar um papel a declarar que recebeu o horário. Há escolas que fazem beberetes para distribuir os horários. Esta distribuição de horários é feita 4 ou 5 dias antes da aulas começarem.

É o absurdo total, porque acontece os horários virem muitos diferentes do que foi combinado. 

Por exemplo, mudaram os anos de escolaridade ou as turmas... na minha escola isto da distribuição do horário pelos professores melhorou muito e agora enviam-nos o horário nos primeiros dias de Setembro, mas foi há pouco tempo porque antes acontecia ter acesso ao horário 3 dias antes de começarem as aulas; às vezes descobria que afinal, em vez de ter 10ºs anos tinha 12ºs anos... alguém (amigo especial), tinha pedido para ficar com 10ºs e tinham mudado o meu horário, por exemplo. Às vezes chateava-me à brava porque tinha andado a preparar aulas para um ano que não tinha. 

Quando dava aulas há meia dúzia de anos estas coisas stressavam-se. Achava, e ainda acho que isto é um sinal de grande incompetência e mentalidade provinciana e mesquinha. Houve um ano em que me lembro de ir à direcção numa sexta -as aulas começavam na segunda- perguntar quando me davam a porcaria do horário porque as aulas começavam segunda. Acho que contei isso no outro blog. Estava chateada. Aliás contei várias peripécias que me fizeram, a mim e a outros, com os horários.

No resto, infelizmente não melhorou e é igual a tantas escolas. Os horários são meio secretos... é ridículo porque sabemo-los na mesma porque falamos uns com os outros. Depois, só para dar uma ideia das coisas, desde Setembro de 2018 que trabalho com um adenocarcinoma activo, a fazer tratamentos agressivos. Entretanto, para além da doença estou cheia de sequelas da radio espalhadas pelo corpo, algumas que têm que estar sempre a ser vigiadas com exames médicos. Canso-me. Subir escadas deixa-me sem fôlego. Há alturas em que tenho dores tremendas. Pois tenho tido sempre um horário lectivo mais pesado, com mais turmas e alunos que outras pessoas que não têm nenhum problema de saúde mas têm sempre uma turminha ou duas desde há anos. Alguns ainda se queixam à nossa frente... lol

Mas isso não me importa porque não gosto de pedir favores e prefiro fazer o meu trabalho, que faço. Estou só a dizer porque é escandaloso. Já não acho normal que a lei não permita que pessoas com doenças como a minha ou outras incapacitantes tenham redução de tempo lectivo ou pelo menos de número de alunos nas turmas. Mas enfim, isto é o normal nas escolas e não há pudor. Seguem a cartilha do governo: 70 ministros a fazer nada, sendo que alguém nos ministérios há-de estar sobrecarregado de trabalho como um mouro porque ele tem que ser feito.

As tutelas, gostam deste sistema feudal criado pela Rodrigues para pôr os professores uns contra os outros (no que teve muito sucesso) em que a escola se tornou e alimentam-no. Aliás, para mim, sempre que uma nova equipa chega ao ME este é o teste que me mostra se são pessoas democráticas que se interessam pela educação ou se são carreirista autoritários que só se interessam por si mesmos: é ver se alimentam o feudalismo. 

Quero querer que haverá escolas que não são feudos e onde não se façam estes absurdos que são causa de grande desunião e ressentimentos entre colegas. 


12 comments:

  1. 7.°
    9.°
    10.°
    12.°

    4 níveis; é assim todos os anos: 3 pu 4 níveis. Os mnhaeus colegas de departamento não estão melhor. Há quem tenha 5. Estamos a falar de Português.
    Adorava um dia ter apenas um nível (pela primeira vez na vida), mas tal não vai acontecer. Em escolas pequenas é assim.
    Cansa muito. Quando se chega a abril, começa a fazer-se o mínimo, porque mental e fisicamente o desgaste já não dá para mais.
    É a vida...

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    1. Tenho uma amiga de Biologia que também costuma ter esses níveis todos!
      Eu só tenho um nível. Mas estou no topo da carreira a um ano e meio da reforma....

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  2. Isso é estranho. Essa combinação.

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  3. De acordo com tudinho que escreveste!
    Nos idos de 80, quando comecei a dar aulas, aos sábados, tinha os dois primeiros tempos da manhã (ia, pela fresca, para a Amadora, sendo que vivo em Lisboa) e, depois só tinha os dois últimos tempos da tarde.
    Era um típico horário de professora provisória, como se dizia na altura!
    Os horários bons iam para os amigos, claro!

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    1. No segundo ano em que dei aulas tinha, à quarta-feira, as sete turmas do horário. Quatro de manhã, três horas de intervalo ao almoço e três aulas à tarde. Tinha uma turma com 40 alunos. Como não ia a casa porque era longe, puseram-me duas horas de apoio à hora de almoço... Perguntei à minha delegada se aquilo era normal. Disse-me que sim porque era provisória. Um dia em Dezembro, senti-me muito mal, numa quarta-feira. Estava grávida nessa ano. A partir do 2º período comecei a faltar às quartas. O presidente do conselho directivo ameaçou-me. Gente sem um pingo de decência. Estive dois anos nessa escola. Estive a um passinho de desistir de ser professora.

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  4. Eu gosto. Estou cansada de dar aulas. São muitos anos.....e como não vou para a escola para conviver nem para mostrar as fatiotas mas sim para trabalhar, ter só um nível é muito menos cansativo. Dou as aulas e venho-me logo embora!

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  5. Não percebo o que é que ter vários níveis tem a ver com fatiotas... para mim ter um só nível é extremamente cansativo no sentido de secante. Apesar das turmas serem diferentes, estares a trabalhar o mesmo programa, os mesmos temas, hora após hora com 4 ou 5 ou 7 turmas é um horror. Uma pessoa chega ao fim do dia com a sensação que os alunos são todos incapazes por já ter explicado as coisas tantas vezes... Mesmo agora que tenho menos turmas por causa da idade, prefiro ir mudando de temas e assuntos, é mais estimulante.

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  6. Claro que as fatiotas não têm a ver com os níveis mas sim com querer estar na escola, no convívio com os colegas.
    Já falámos pessoalmente sobre este assunto - eu quero-me ir embora do ensino. Só que ainda não tenho idade para me poder reformar. Assim, quanto menos níveis tiver, menos trabalho tenho. E, mesmo assim, já é muito com 5 turmas. Mas, pelo menos, são só do mesmo nível...

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  7. Eu estou tão chateada e até revoltada que percebo isso muito bem.

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  8. Eu faço 64 anos em Dezembro. Já chega de trabalhar! É que ainda gostava de gozar a minha reforma com saúde, caramba! Será que é pedir muito? Tenho 40 anos de descontos, fónix !

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  9. Pois, mas a mim, a Lurdes Rodrigues, essa mulher burra e repugnante, roubou-me tantos anos de trabalho, mas tantos, que nem que trabalhasse até aos 80 anos chegava ao topo da carreira.

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