May 09, 2020

Livros - Cartas de Estalinegrado



Estive a ler este livrinho que comprei há uns dias numa alfarrabista. Já tinha ouvido falar no livro. O livro é pequenino. Tem algumas das sete sacas de cartas mandadas apreender pelo alto-comando alemão, a poucos dias da derrota de Estalinegrado, com o intuito de saber do moral das tropas. Um bocadinho tarde, não...?

São homens que sabem que é a última carta que escrevem, de modo que a maioria aproveita para despedir-se das mulheres, das mães, dos pais, etc. E há de tudo: um jardineiro, um astrónomo, um pianista que perdeu os dedos... enfim... uns resignados, outros revoltados, outros decididos a matarem-se antes de serem apanhados, outros -só um ou dois- na ilusão de voltarem e retomarem a vida. A última carta é de um filho de um general que pediu ao pai que arranjasse maneira de o tirar dali porque aquilo é um inferno absurdo e a quem o pai mandou, embora não por estas palavras, morrer em serviço. O filho escreve-lhe a dizer o que pensa.

É impressionante porque percebemos que eles sabem que têm poucos dias de vida, na melhor das hipóteses e que as hipóteses de escaparem dali sem ser para a Sibéria ou para a eternidade são praticamente nulas.

Vou deixar aqui a carta do pianista que perdeu os dedos e escreve à mulher a dar a notícia, porque sabe que ela espera que ele regresse (todas esperam e muitos deles dizem-lhes para não terem esperanças que não é possível saírem dali) e volte a tocar.

A guerra é isto... um absurdo testemunho da loucura dos homens.



daqui

4 comments:

  1. É preciso não esquecer que a União Soviética teve 20 milhões de mortos.....pelo menos! Porque se contabilizarmos os civis a coisa vai parar aos 26 milhões. É muita morte!

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  2. Eu sei. E sei o que foi o cerco a Leninegrado, mas diante da morte, um ser humano é um ser humano.

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  3. Mas uns são mais responsáveis que outros .
    Da mesma forma que condenamos Estaline pelos seus crimes também temos de condenar Hitler pela mortandade que fez em todo o mundo!Senão, começávamos a arranjar desculpas para toda a gente!

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  4. Mas uma coisa não tem a ver com outra. É claro que os nazis foram responsáveis, mas isto é outra questão, que não apaga a responsabilidade: é a questão da humanidade, de como os homens ao longo da história começam guerras por motivos de ganância, orgulho, vaidade, vinganças ou de loucura e no fim o que resta é o absurdo do desperdício das vidas e o sofrimento de milhares ou milhões às mãos dos viciosos cruéis que sempre florescem nas guerras. Faz pena quando pensamos no sofrimento, nas vidas interrompidas e depois tentamos procurar uma razão e nenhuma razão é razoável. E já viste a sombra que o Hitler deixou ao povo: aos filhos, aos filhos dos filhos e por aí fora? Há pessoas que fazem vir ao de cima o melhor que os outros têm e há outros que fazem vir ao de cima o pior que eles têm e nestes casos é tudo uma tristeza: essas pessoas, seres humanos patéticos e as outras que os seguem como se fossem deuses...

    Não sei, é como Kant, um filósofo extraordinário que quando começa a falar de si e das mulheres parece que é outra pessoa. Ontem estava a ler um dos ensaios de Montaigne onde fala da amizade e a certa altura resolve falar da diferença entre os homens e as mulheres e começa a enaltecer a amizade entre os homens e a dizer que as mulheres são incapazes de amizade porque é um sentimento profundo... e outras coisas ofensivas. Não sei... há pessoas que se revoltam com isto, a mim faz-me pena, neste sentido em que me faz ver as falhas humanas que estão na origem de grandes males.
    Eu descobri a Filosofia com Heidegger e um dia descobri que ele era nazi e de início foi uma desilusão mas depois o que percebi é que as pessoas são humanas e cheias de falhas e uma coisa está ligada à outra.
    Isso foi uma grande lição e em parte é por isso que não endeuso ninguém e volta e meia vou ler essas barbaridades que os filósofos dizem sobre as mulheres, para me lembrar que são humanos. Estes soldados que escrevem estas cartas também são humanos e é isso que torna tudo mais trágico.

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