Exercer os seus direitos de cidadão, mesmo quando ou, sobretudo quando, é difícil. E ainda, escolher fazê-lo sem violência, sem intimidação (como é o hábito dos que defendem que as mulheres devem ser forçadas a reproduzir-se), mas não abdicando da sua posição. Aqui uma quantidade grande de estudantes abandona a sala onde ia ser comemorada a conclusão da sua licenciatura, devido à oradora ser uma activista contra os direitos reprodutivos das mulheres.
Incoming medical students walk out at University of Michigan’s white coat ceremony as the keynote speaker is openly anti-abortion pic.twitter.com/Is7KmVV811
— Scorpiio (@PEScorpiio) July 24, 2022
Por vezes não resisto a uma polémica, porque sei que estamos em campos contrários no que diz respeito ao aborto. E friso 'no que diz respeito ao aborto' e não 'no que diz respeito à forma de evidenciar uma posição quanto ao aborto'.
ReplyDeleteNão me parece que isto seja cidadania, mesmo que o discurso da pessoa em questão fosse uma posição pública contra o aborto, o que não me parece que fosse o caso. E, a não ser que eu esteja enganado, se o discurso não era anti-aborto, então o que se fez foi contestar a pessoa, mesmo que ela estivesse ali a falar do juramento de Hipócrates ou da necessidade de cuidados médicos mais humanos. Ora, se o discurso não é "doutrinário", então a suposta cidadania exerceu-se contra a pessoa, não contra as ideias da pessoa. O ataque é ao indivíduo, não às opiniões do indivíduo. Se assim for, todos nós nos levantaremos permanentemente, porque à nossa frente pode estar alguém que defende posições opostas das nossas. E, nessa altura, o respeito pela divergência de opiniões está um patamar abaixo (ou acima?) de cidadania (expressão que, confesso, me taquina ligeiramente).
Por vezes parece-me que aqueles que defendem mais a inclusão são os que têm o discurso menos inclusivo. A menos, o que pode ser uma possibilidade, eu não esteja a perceber o conceito de inclusão.
Obrigado pelo espaço para polemizar; alonguei-me, o que acontece frequentemente.
Ela -chama-se Kristin Collier- está ali, não como particular mas como representante da universidade, a falar em nome da universidade. A direcção escolheu-a para representar a universidade e os estudantes entendem que devem protestar, serem representados por uma pessoa que defende que se neguem cuidados de saúde a mulheres que escolhem interromper a gravidez.
ReplyDeleteA escolha desta médica para representar a universidade nesta cerimónia, que é pública, tinha sido objecto de uma petição de centenas de estudantes e médicos por associar a universidade, qua não é anti-IVG, à visão da religião sobre os cuidados médicos a essas mulheres; ora, a direção ignorou-os. Então, abandonar a sala foi uma maneira de dizer, 'estamos contra esta escolha e ela não nos representa'. É um exercício de cidadania.
Em Portugal, durante a ditadura, aconteceu o Américo Tomaz ir a universidades e os estudantes abandonarem a sala. Não que estivessem contra a pessoa que ele era, mas estavam contra o que ele representava e foi uma maneira de o dizer. Tomar uma posição pública, mostrar claramente que aquela pessoa não os representa.
Vezes demais as pessoas se calam e não tomam atitude, sobretudo em público, para mostrar o seu desacordo com políticas, geralmente por medo das consequências quando esse exercício é um direito de cidadão.
Também me alonguei...
O Américo Tomaz era o Presidente da República e, nessa capacidade, representava o país e falava em nome do País (ou do governo). Os protestos eram políticos. Protestar contra o AT era protestar contra o governo.
ReplyDeleteEsta pessoa (agradeço as suas informações, que desconhecia por completo) representa a universidade e, uma vez que a universidade não é anti-IVG, ela estaria lá por um mérito profissional / académico / humano qualquer, não pelas suas ideias sobre a IVG. E qual seria a intenção da Universidade de a escolher e não aceitar o protesto?
A propósito de universidades, alguma vez viu uma série na Netflix (penso eu de que...) que se chama (também penso eu de que...) A Directora?
Não, ela não está lá por mérito académico mas por ser uma activista que mistura medicina e religião na luta contra os direitos reprodutivos das mulheres, o que deve estar de acordo com pessoas da direcção. Ela foi escolhida para representar a universidade de maneira que os estudantes exercem o seu direito de protesto e fazem muito bem, em meu entender.
ReplyDeleteNão tenho Netiflix mas já vi essa mini-série com a Sandra Oh - se é que é essa.