O Primeiro Encontro de Gadamer com Heidegger
O meu primeiro encontro com Heidegger em Freiburg transcorreu de maneira extremamente estranha. Dirigi-me à sala na qual ele tinha o seu horário de atendimento e percebi que havia vozes na sala. Assim, retirei-me e fiquei esperando no corredor. Então, a porta se abriu e uma pessoa foi levada para fora por um homem muito pequeno de olhos pretos. Eu disse para mim mesmo: “Que pena, ainda tem alguém lá dentro”. E continuei esperando. Somente depois de um longo tempo procurei escutar de novo junto à porta, não ouvi mais vozes, bati e entrei. O pequeno homem moreno que não correspondia de maneira alguma às minhas expectativas era Martin Heidegger. Quando comecei a conversar com ele e vi os seus olhos, compreendi sem qualquer comentário que fenomenologia tinha alguma coisa em comum com a visão. Nesses olhos não havia apenas perspicácia penetrante, mas antes de tudo também fantasia e força intuitiva. Durou muito tempo até que aprendesse a desenvolver em mim, nos limites de minhas possibilidades, essa força intuitiva fenomenológica que se tornou hoje quase totalmente desconhecida. Naturalmente, passei a frequentar a preleção semanal de uma hora dada por Heidegger sobre ontologia, os pós-seminários oferecidos por ele sobre Aristóteles e sobre “Investigações Lógicas”, assim como o seminário sobre o livro 6 da “Ética a Nicómaco” e um seminário aos sábados sobre o escrito de Kant sobre a religião, organizado juntamente com Julius Ebbinghaus. Todos esses cinco cursos foram determinantes e inesquecíveis para mim.
— GADAMER, Hans-Georg. “Hermenêutica em Retrospectiva: Heidegger em Retrospectiva”, Vol. I. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2007, p. 11 e 12. Tradução de Marco Casanova.
Foto: Gadamer a esquerda e Heidegger, a direita.
No comments:
Post a Comment